Fichamento: Max Weber e a História
I – As fontes da metodologia weberiana: a Polemica contra a Escola Historia
Alemã
O pensamento da historia no século XIX
O
século XIX foi o século da historia. A
denuncia da “abstração” era o interesse pela individualidade das manifestações
do espírito, a ambição era mostrar o que era próprio de cada época da cultura,
e como este próprio se refletia em todas
as dimensões de sua existência. Alguns nomes emergem. A filosofia da historia
de Hegel, a relação (indireta, é verdade) entre Max Weber e Hegel é uma das
chaves que permitem compreender o pensamento weberiano. Hegel utilizou-se dos recursos de seu tempo
denominando “espírito do povo” a homogeneidade de sentido que reúne em uma
totalidade. Á diferença dos juristas, ele não renegou, a
valorização da individualidade de cada época da cultura não lhe parecia
incompatível com a idéia de um progresso dos espírito. A sucessão das grandes
civilizações se deixa ordenar segundo um processo acumulativo, conforme a
inspiração das Luzes, era a realização da liberdade. O conceito da filosofia da
história, em sua interpretação helegiana representa a história. Essa simplificação é acompanhada de algumas
confusões grosseiras, a identificação deste conceito com um determinismo
excluindo todo domínio dos homens sobre o seu futuro, sua assimilação a uma
variedade de evolucionismo, gelianismo não tinha nada em comum com todas essas
doutrinas que viam apenas o dever das sociedades humanas como “a necessidade
abstrata e desprovida de razão de um destino cego”. Contemporâneos ou os
sucessores imediatos de Hegel, não economizavam , porém, criticas ao filosofo.
O conceito de filosofia da historia foi atacado, a filosofia da história não
era, senão um avatar da providência cristã. Os jovens hegelianos eram, é
verdade jornalistas independentes em ruptura com quadros tradicionais da
carreira acadêmica. Leopoldo von RANKE (o mais prestigioso representante da
escola de histórica da Universidade alemã do século XIX). A polemica de Ranke
contra a filosofia hegeliana entrelaça, três temas de estatutos muito diferentes.
O primeiro é teológico: supor que Deus não tratou de maneira igual todas as
épocas da cultura humana, leva a suspeitar que Deus seja injusto. Este motivo
permite reintroduzir, o tema da ontologia romântica, cada individualidade
histórica encerra nela mesma a riqueza de sua significação. A igualdade de Deus
e a ontologia romântica se conjugam, enfim, para justificar o imperativo
metodológico: o historiador deve, modestamente, se ater ao seu objeto, isto é a
analise empírica do dado.
Descrever “o que foi, como lá o
foi” era a ambição de Ranke, isto implicava recusar toda fixação. O
surpreendente é que essa emancipação da tutela da filosofia se efetuou em nome
da ortodoxia religiosa. Em Ranke, é a
resistência ao racionalismo helegiano, motivada pela preocupação em preservar a
zona de obscuridade em que pode desabrochar a crença, que abriga a
reivindicação de empiricidade da historiografia: o vai de encontro a nossos
contemporâneos a ver na filosofia idealista uma rejeição da teologia, e a
acreditar, à ciências modernas, terem rompido com os mundos anteriores,
religiosos ou especulativos.
A critica weberiana da escola histórica
Max
Weber foi, é verdade, inicialmente um jurista. As fronteiras entre as
disciplinas não eram, todavia, tão bem demarcadas como hoje. No curso mesmo de
sua breve carreira de “jurista”, Weber já tinha manifestado o que permaneceria
uma constante, entrecruzamento das diferenças “ciências humanas”. Weber
inscreveu explicitamente seus trabalhos na filiação da economia política
histórica, uma confrontação com dois representantes desta escola, Wilhelm
Roscher e Karl Knies. Ela interveio no quadro de uma crise do pensamento
econômico, se confrontavam os defensores da tradição histórica e aqueles que se
esforçavam em separar a economia da historia para fazer uma ciência teórica,
visando estabelecer as leis abstratas. Os segundos decidiram o futuro de sua
disciplina: o marginalismo e a economia geral. Weber reconhecia o credito dos
economistas “puros” em ter acentuado a diferença de gênero que separa o
conhecimento legal ou nomologico (conhecimento das leis) e o conhecimento da
realidade concreta. Ele se recusou a seguir em sua posição intransigente à
pesquisa empírica. Seu erro para Weber era o de ter tomado a formulação de leis
abstratas pelo objetivo supremo, veicula um equivoco. Por não terem refletido
sobre a função dos esquemas inteligíveis puramente formais na lógica nutriram a
ilusão de que um a dedução da realidade a partir de proposições abstratas. A
economia concebia sua empresa na perspectiva de uma colaboração entre muitas
disciplinas, de modo que, ao final ö conjunto destas teorias abstratas deveriam
conter a verdadeira realidade das coisas.
Weber
reencontrava, na economia abstrata uma variante da concepção dedutivista. Nem
por isso ele desconhecia a fecundidade da formalização conceitual, a teoria do tipo
ideal, é, entre outras coisas, uma tentativa de precisar o lugar das
construções abstratas do pensamento. A ciência ganha clareza elucidando por
meio de tais esquematizações as noções das quais ela faz uso. Ela desvia, por
outro lado, se tomar como fim o que não é senão maio do conhecimento. Pois o
tipo ideal não da conta da efetividade histórica. Apresentar o enunciado de
tais leis como o objetivo da pesquisa é se comprazer como os jogos lógicos do
entendimento. Ciência da realidade para qualificar o tipo se saber. Nela se
indicam a característica histórica proposta e a natureza empírica da pesquisa.
Uma
ciência da realidade tem por objetivo a inteligência de sua estrutura e de gênese.
Da mesma maneira que Ranke, Weber sublinha a vocação da historia, para o estudo
do domínio empírico, porem de modo radicalmente diferente. Os ensaios sobre
Roscher e Knies, fica claro as criticas que Weber dirige a estes dois, não são
as mesmas que lhes fazem os partidários da economia abstrata. Longe de
contestar o objetivo empirista, ele reprova não terem respeitado todas as
exigências desse objetivo.
Weber
via no “panlogismo”hegeliano uma solução original a um problema, entre o
conceito e a realidade, isto é, do vazio, entre os produtos do pensamento e a
infinita riqueza do concreto. Ele da a esta solução a nome de emanatismo: ela
consiste em uma hispótese que confere aos conceitos universais os estatuto de
entidades supra-empiricas das quais a variedade de fenômenos é suposta
derivada. Uma das vantagens deste procedimento é permitir um aparente
paralelismo entre o estilo de argumentação do historiador e a rigorosa
demonstração do matemático. Ainda que rejeitando, em principio, a filosofia
hegeliana, ela continua, todavia, a trabalhar com “as representações
metafísicas. Ao perpetuar o uso de tais conceitos sem o suporte ontológico, os
historiadores encerravam-se em uma armadilha. Os préstimos efetivos das
ciências empíricas estão sempre em falta para com a ambição de uma dedução
perfeita. Weber ressalta com relação a Roscher, a curiosa cumplicidade, já
presente em Ranke, entre a sobriedade da pesquisa empírica e a ortodoxia
religiosa. Este equivoco traduzia, a contradição da escola histórica. Weber deixava
entender o que seria seu próprio projeto de conhecimento: realizar o que a
escola histórica quis fazer, mas com os meios inadequados, a saber, a
transformação da historia em ciência empírica.
A reforma do método
Weber
contesta a idéia de que o cientista
deveria estar plenamente seguro das regras segundo as quais ele procede antes
mesmo de iniciar o trabalho, crer que o pré-ambulo metodológico a condição
necessária da exatidão do trabalho de pesquisa concreta. O que Weber censurava nos economistas da escola histórica era a
dependência em que permaneciam, via essa marca de dependência no sua de que
faziam das categorias gerais. A sociologia também não pode ser praticada senão
partindo da ação do indivíduo, ou indivíduos. Por estar situada no cruzamento
ético-politicas e os postulados a noção de individualismo tornou-se hoje em dia
uma das noções mais equivocadas, o indivíduo representa o “limite superior” do
ponto de vista próprio da sociologia quando compreensiva, ou quando ele
atribuía como tarefa à sociologia a redução dos conceitos coletivos ä uma
atividade compreensível” tratava-se simplesmente de um alerta. As entidades
coletivas não são mais do que coagulações de certos tipos de praticas , estado,
associação categorias que representam as espécies determinadas da cooperação
humana, ele se preveniu contra um interpretação substancialsta equivocada, se
proscreve, toda tentação de atribuir a estas entidades o estatuto de sujeitos
autônomos cujas tendências possuam valor explicativo, qual ele entendia o
confinamento da ciência ao empírico. Era uma tradução da recusa dos
mundos-anteriores ao nível da lógica da construção dos conceitos das ciências
sociais. Mesma preocupação conduzia-o a categorias fundamentais poder e
dominação. O que confere ao Estado, à dominação, ao poder, sua existência são
as atividades dos homens que as suportam. A lógica destas praticas é a razão
das estruturas que se engendram por ela. A noção de tipo ideal, função de
exorcizar os fantasmas ligados ao uso dos conceitos coletivos. Weber destinou a
titulo de tipo ideal a conceitos de estatutos muito diferentes, talvez resulte
do fato de que se demanda da teoria do tipo ideal outra coisa. Weber não
pretendeu trazer para as ciências humanas um instrumento original, ele desejava
sublinhar conceitualizaçao que efetuam sempre historiadores.
III- Racionalização e desencantamento do mundo
Weber
esboçou um quadro que resumiu num termo racionalização. Diz-se que ele se
recusou explicitamente a inferir o desenvolvimento do capitalismo, de uma
posição de principio sobre os problemas fundamentais. Entretanto, ao qualificar
como racionalização a lógica comum dos processos, engendrou a civilização
ocidental moderna não conferiu ele um tipo de unidade de sentido a sua
historia? E o termo “racionalização” não sugere a idéia de uma superioridade do
Ocidente? Encontramo-nos aqui no cerne do equivoco.
A universalidade problemática da civilização
ocidental
Max
Weber conferiu à civilização ocidental um valor universal? Weber tem ou não por
certo que os fatos da civilização característicos do Ocidente possuem uma
significação que interessa à humanidade inteira? A questão, distinta daquela do determinismo
histórico, conceito weberiano de historia, exclui toda idéia de um
desenvolvimento necessário cujo fim prescrito desde sempre fosse esta
civilização, ao reconhecer a contingência de civilização ocidental, é possível
interpretar o modo de ser do homem formado por esta civilização, a qual
permitiria concretizar. Em lugar de submeter a pré-historia do Ocidente à regra
de uma lei necessária, essa hipótese conduz
a tratar esta pré-história sob as categorias do obstáculo. Traços
distintivos das civilizações e sociedades não ocidentais simples negativos
daqueles da modernidade ocidental, na China ou na Índia. Por que os
desenvolvimentos científicos, artísticos, estatal ou econômico não lhe
conferiam os caminhos da racionalização. Essa orientação da interrogação é
constante no conjunto dos trabalhos de Weber. Conceitos weberianos funcionam,
com efeito, freqüentemente por pares de oposição. A prevalência, porem, da
referencia do Ocidente persiste de todo modo. Seria concluir muito rapidamente,
entretanto, ver na noção weberiana de racionalização simplesmente uma das
expressões de preconceito eurocentrista. Weber era muito consciente da
polissemia dos termos racionalidade, racionalização ou racionalismo. A vida
pode ser racionalizada conforme ponto de vista finais extremamente diversos
buscando direções extremamente diferentes, o “racionalismo” é um conceito histórico.
Não se pode falar de um desenvolvimento da racionalidade em seu conjunto,
porque a historia do racionalismo não progride no mesmo passo em todos os
domínios. Racionalizações parciais não se podem adicionar para compor, o quadro
de uma racionalização integral, que ilustraria a sociedade capitalista moderna.
A tudo isto se soma, o antagonismo das escalas de valor ultimas, ou seja, a
heterogeneidade irredutível dos fins.
Um etnocentrismo metodologicamente fundado
O
comparativismo weberiano comandado por uma interrogação orientada
exclusivamente na direção da inteligência da civilização ocidental moderna.
Muito voluntariamente, quando ele trata de civilizações estrangeiras ele apenas
se interessa pelo que elas tem em contraste com este complexo de estruturas e
de características materiais e ideais que constituem nosso presente. A
introdução a Sociologia das religiões justifica a limitação da proposta apenas
a ética econômica das religiões, unicamente aos aspectos desta suscetíveis de
ter exercido uma influencia, sobre a formação dos comportamentos dos agentes
sociais no sentido do racionalismo econômico, os traços das religiões
importantes para a ética econômica, da natureza de sua relação com o
racionalismo econômico. Diz Weber o capitalismo é a forca “mais determinante do
destino de nossa vida moderna”. A racionalização é, de fato, um processo
orientado, no sentido que o entendia Marx quando constatava, na Introdução da
Contribuição à critica da economia política. Para poder pensar o passado com a
historia, afirmava ele, (Weber) é necessário que nos coloquemos em condições de
assinalar , as ausências que não se verificam senão com relação a presenças
vindouras. A noção de “racionalização” cuja totalidade constitui a gênese da
civilização ocidental moderna, revela-se assim como uma forma moderada de
teologia, à qual o historiador não pode escapar por necessidade metodológica.
No principio de uma pesquisa na delimitação de um objeto, há interesses do
pesquisador. O cientista é sempre um porta-voz das escolhas axiológicas
fundamentais da civilização a que ele pertence. Toda leitura evoca a
representação de um “progresso” e permanece de qualquer maneira sempre
teológica. No plano estritamente lógico, a infinidade de pontos, a infinidade
de pontos de vista possíveis, eles são os pressuposto extrateoricos. O
interesse que leva o historiador ao passado deve ser mediatizado por um
interesse pela compreensão do presente. Qualquer que seja a extensão da
liberdade que a metodologia weberiana reconhece à imaginação do cientista, ela
nunca é mais do que filha do seu tempo.
O desencadeamento do mundo: ele uma acepção técnica
a um sentido amplo
O
cristianismo herdou do judaísmo a hostilidade à magia , elemento decisivo, no
espírito se nosso autor, para dar conta dos traços distintivos da historia
ocidental. No texto Ä ciência como evocação” apresenta o desencadeamento do
mundo como o produto do processo de intelectualização que acompanha a formação
do Ocidente moderno. Mundo intelectualizado é um mundo no qual reina a convicção
de que tudo neste mundo está regido pelas leis que a ciência pode conhecer não
há nada que ano seja previsível. É apenas quando a lógica da economia
capitalista produziu, dela mesma, os comportamentos que ela requer para se
perpetuar que o desencantamento pode ser considerado cumprido.
O “politeísmo dos valores”, produto do
desencantamento”
O
progresso cientifico e técnico não é a causa de racionalismo. Uma vez colocado
em movimento se torna um de seus fatores mais poderosos: conhecimento da astronomia,
da biologia, da física ou da química. As religiões puderam assumir outrora a
forma de interpretações sistemáticas e racionais. A hegemonia grandiosa das
idéias de previsibilidade e de calculabilidade, porem, repele toda a crença e
toda a questão do sentido. O banimento dos valores supremos de nossa
modernidade subtraindo aos valores de referencia da ação a evidencia que lhes
conferi o consenso global. A incompatibilidade entre valores últimos da ação
determina a situação existencial do homem moderno. As civilizações humanas não
são iguais. Existe uma forma superior de civilização (Hochkultur),
caracterizada pelo fato de que ela tornou possível e necessária a emancipação
acerca de todas as significações estabelecidas passivamente recebidas do costume
e da tradição.
Entre
a afirmação ingênua da validade absoluta do saber cientifico, de um lado, e um
historicismo radical que relativizasse a verdade do saber ao mesmo tempo que a
dos valores éticos, por outro lado, Max Weber ocupa uma posição mediana. As
formas do nosso saber são o produto dos modos de relação do homem com o mundo.
O desencadeamento é, o levantar do véu que escondia aos homens a realidade de
seu estar-no-mundo. Malgrado todas suas reservas para com a racionalidade
ocidental, Weber não pode evitar pensar a formação do Ocidente sob a categoria
clássica de uma teologia, para evitar as miragens que evocam as entidades
coletivas, esforça-se por reconduzir as estruturas sócio-historicas à lógica da
ação que as sustenta.
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