As concepções teóricas sobre território, a partir das
contribuições dos autores abaixo relacionados. Apontamentos teóricos e exemplos empíricos acerca do termo
territorialidade.
“...é
o uso do território, e não o território em si mesmo, que faz dele objeto de
analise social. Trata-se de uma forma impura, um híbrido, uma noção que, por
isso mesmo, carece de constante revisão histórica”. SANTOS,
Milton. “O retorno
do território.” In: SANTOS, Milton. et alli (orgs) Território, Globalização e
Fragmentação. Editora Hucitec. São Paulo, 1996. p. 15.
Milton Santos é autor de várias
obras que dizem respeito a definição de “território”. No exemplo do texto
supracitado, admite que o conceito de “território” carece de constante revisão.
A partir desta constatação, posso dizer que o presente trabalho se concentra em
exemplificar, utilizando-se de variados autores, o conceito de ‘território’,
sem nunca tentar esgota-lo.
Respeitando a ordem de textos
proposta para a avaliação, iniciarei pela obra de Carlos Robert Moraes,
continuando o exame a obra de Milton Santos pouco depois.
Carlos Robert Moraes, define
território a partir de sua prática social, seja ela política, econômica ou
cultural, ou mesmo as três juntas. Portanto, em sua concepção, o território: “é o trabalho social que qualifica o espaço,
gerando um território” MORAES, Carlos Robert. Território. 1989.
Raffestin,
destaca o estudo da semiologia. O território seria “o resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático em qualquer
nível”. Destaca ainda que algumas
estruturas podem servir de referência para determinadas pessoas, como por
exemplo, o WTC, uma referência econômica de Nova York. Ainda segundo o autor, o
“território”, em eterna transformação, movimento, pode concentrar “nós”, que são pontos de convergência
dentro de um território.
“O território
se forma a partir do espaço; é uma produção a partir do espaço” ; “é um espaço onde se projetou um trabalho, seja energia e informação,
e que, por conseqüência, revela relações marcadas pelo poder” O autor
termina por relatar a relação entre limite e território: “falar de território é fazer uma referência implícita à noção de
limite que, mesmo não sendo traçado, como em geral ocorre, exprime a relação
que um grupo mantém com uma porção do espaço. A ação desse grupo gera, de
imediato, a delimitação”. Raffestin,
C. “o que é território”. In: Por uma
Geografia do Poder. São Paulo. Editora Ática. 1993. p. 143; p. 144. p. 153.
Já
Marcelo José Lopes de Souza, crítico da concepção de território estaria ligada
apenas ao Estado, analisando que o território pode existir aquém e além do
território nacional, afirma que território é“um
campo de forças, uma teia ou rede de relações sociais que, a par de sua
complexidade interna, define, ao mesmo tempo, um limite, uma alteridade: a
diferença entre “nós” (o grupo, os membros da coletividade ou “comunidade”, os
insiders) e os “outros” (os de fora, os estranhos, os outsiders)” e, é
também: “um espaço definido e delimitado
por e a partir de relações de poder” ;
“territórios são antes relações sociais projetadas no espaço que espaços
concretos” ; “o território não é o
substrato, o espaço social em si, mas sim um campo de forças, as relações de
poder espacialmente delimitadas e operando sobre um substrato referencial”
SOUZA, Marcelo José Lopes de. “O território: sobre espaço e poder, autonomia e
desenvolvimento” In: CASTRO, I. et alli (orgs). Geografia: Conceitos e temas. Editora Bertrand Brasil, Rio de
janeiro. 1995. p. 86; p. 78; p. 87; p. 97.
Milton Santos, no mesmo texto que já
foi citado, conceitua território como sendo também, na democracia de mercado, “o suporte de redes que transportam regras e
normas utilitárias, parciais, parcializadas, egoísticas, as verticalidades,
enquanto as horizontalidades hoje enfraquecidas são obrigadas, com suas forças
limitadas, a levar em conta a totalidade dos atores”. SANTOS, Milton. “O
retorno do território”. In: SANTOS, Milton. et alli (orgs) Território, Globalização e Fragmentação. Editora Hucitec. São
Paulo, 1996. p. 19.
Ainda
assim, em outro texto, Milton santos estende o conceito de território a
compreensão de um “abrigo”: “o território
visto como verticalidade, como conjuntos de pontos, é apenas um recurso para os
atores internos e externos preocupados apenas com as suas próprias finalidades
e indiferentes às finalidades dos outros [...]. No entanto, para os atores não-hegemônicos o território não é formado
como um conjunto de pontos, mas como manchas tais quais o território, não é
apenas recurso, mas também abrigo” SANTOS, Milton. “Nação, Estado e
território”. In: SANTOS, Milton. Nação e
poder: as dimensões da história. Niterói. EDUFF. 1998. p. 26.
Milton
Santos, ligando a idéia de território ao Estado ressalta: “o território é um nome político para espaço de um país. Em outras
palavras, a existência de um país supõe um território.” SANTOS, Milton. “A
questão: o uso do território” In: SANTOS, Milton e SILVEIRA, M. L. O Brasil território e sociedade no início do
século XXI. Editora Record. São Paulo. 2001. p.19.
Haesbaert,
inicia seu trabalho destacando a definição naturalista do século XVIII de
território, onde o homem existe como se fosse a sua continuidade, e portanto
tivesse uma “impulsão inata” para conquista de territórios. De outro modo, uma
visão materialista também abordada, onde ao território é vinculada um caráter
material. Haesbert, se propõe em analisar o conceito de “território” sem deixar
de lado a multiplicidade de escalas que podemos encontrar hoje em dia e sem
dissociar as concepções naturalista e materialista: “o produto de uma relação desigual de forças, envolvendo o domínio ou
controle político-econômico do espaço e sua apropriação simbólica, ora conjugados
e mutuamente reforçados, ora desconectados e contraditoriamente articulados”
Haesbaert, Rogério. Territórios alternativos. São Paulo.
Editora Contexto/EDUFF, 2002.
Segundo a análise de Bertha K.
Becker, no livro “Fronteira Amazônica: Questões sobre a Gestão do Território”,
é possível constatar que Carajás defini-se por território a partir de quando
sabemos como os ocupantes que nele se encontram agem. “há níveis diversos de controle do território. O controle exercido
pelos detentores do poder científico-tecnológico moderno é cientificamente
formulado e tecnicamente praticado, configurando o contexto contemporâneo da
gestão do território” O Carajás é uma região de grande disputa dentro do
Município de Marabá, devido as suas possibilidades econômicas. É onde a
definição de seu território vem sendo transformada: “a extinção dos castanhais, substituídos pela pecuária, numa violenta
disputa pela terra, acentuada com a descoberta do ouro, no final da década de
1970, e a multiplicação de garimpos. Até a implantação do PFC, contudo, as
terras da União em que se situa a serra permaneciam preservadas [...]”
BECKER, Bertha K. “Gestão do território e territorialidade na amazônia: a CRVD
e os garimpeiros na província mineral de Carajás”. et alli. Fronteira Amazônica:
Questões sobre a gestão do Territórico.
Editora UNB. Brasília. 1990. p. 197; p. 202. Assim, utilizando-me do texto de
Carlos Robert Moraes, corroboro a definição de que “território” é devida a sua
prática social, melhor caracterizada neste caso pela utilização econômica.
Roberto
Lobato Corrêa, utiliza-se de princípios de propriedade para definição de
território, e além disso, o conceito de território viria subordinado a um
outro, o espaço. Assim, “O território é o
espaço revestido da dimensão política, afetiva ou ambas” ; ainda assim, o
território é aquele que: “pertencente a
alguém. Pertencente, entretanto, não se vincula necessariamente à propriedade
da terra, mas à sua apropriação. Esta apropriação por sua vez, tem duplo
significado. De um lado associa-se ao controle de fato [...], por parte de instituições ou grupos sobre
um dado segmento do espaço. Neste sentido o conceito de território vincula-se à
geografia política e geopolítica. A apropriação, por outro lado, pode assumir
uma dimensão afetiva, derivada das práticas espacializadas por parte de grupos
distintos [...]. Neste sentido o
conceito de território vincula-se a uma geografia que privilegia os sentimentos
e simbolismos atribuídos aos lugares”. Corrêa,
Roberto Lobato. “Territorialidade
e corporação: um exemplo”. In:
SANTOS, Milton. Et alli (orgs).
Território Globalização e Fragmentação. Ed. Hucitec, 1996. p. 251.
Outro
autor, Robert Sack, destaca a relação humana com o Estado para definição de
território: “é
uma manifestação física da autoridade do estado, e a submissão (ou fidelidade)
ao território ou pátria faz o território parecer como uma fonte de autoridade”.
SACK.
Robert. “Human Territoriality: a Theory” In: Human Territoriality – Its Theory and History. p. 62.
Sobre a
territorialidade:
Por
Raffestin, entende-se como territorialização, quando que “ao se apropriar de um espaço, concreta ou
abstratamente (por exemplo, pela representação), o ator “territorializa” o
espaço”, e que “a territorialidade aparece constituída de relações mediatizadas,
simétricas ou dissimétricas com a exterioridade”. Raffestin, C. “o que é território”. In: Por uma Geografia do Poder. São
Paulo. Editora Ática. 1993. p. 143; p. 161.
Sack
diz que trabalha com o conceito de territorialidade “considerando-a uma estratégia de influência ou controle” e ainda é
a “tentativa de afetar, influenciar ou
controlar ações e interações (de pessoas, coisas e relacionamentos), afirmando
e tentando forçar um controle sobre uma área geográfica” SACK. Robert.
“Human Territoriality: a Theory” In:
Human Territoriality – Its Theory and History. p. 55.
O exemplo
empírico utilizado no texto de Bertha K.
Becker demonstra bem a
teoria de Sack e Raffestin. A região do Carajás, extremamente conflituosa
devido a diferentes interesses econômicos, a cidade é fechada de acordo com a
vontade da CVRD. “em
nível de apropriação do espaço, a gestão da CVRD deixa transparecer, pela
escala e ritmo de sua expansão, seu caráter de vetor da modernização do Estado
e os conflitos dele decorrentes” ; “os conflitos e contradições locais e o
caráter da gestão da Companhia, autônoma e baseada no saber técnico-científico,
traduzem-se em dispositivos de controle que fecham o território de Carajás,
transformado em verdadeira cidadela” , portanto
aferi-se que “territorialidade
pode ser entendida como uma estratégia para influenciar ações através do
controle não só do espaço, mas do espaço-tempo” (p.213) BECKER,
Bertha K. “Gestão do território e territorialidade na amazônia: a CRVD e os
garimpeiros na província mineral de Carajás”. et alli. Fronteira Amazônica: Questões sobre a gestão do
Território. Editora UNB. Brasília. 1990. p. 198. p. 203.
Milton
Santos ratifica o entendimento de que territorialidade dizendo que é ela a
característica imputada a determindo espaço, o “território”. Empiricamente,
Milton Santos indica como exemplo o caso da divisão territorial do trabalho,
pois assim como foi abordado no texto de Becker, a diferença do que se produz,
define a territorialidade. Ainda segundo Milton Santos, pode-se falar de
territorialidade sem Estado, mas é praticamente impossível nos referirmos a um
Estado sem território. “O território é um nome político para espaço de um país. Em outras
palavras, a existência de um país supõe um território. Mas a existência de uma
nação nem sempre é acompanhada da posse de um território e nem sempre supõe a
existência de um Estado.” SANTOS, Milton. “A questão: o uso do território” In:
SANTOS, Milton e SILVEIRA, M. L. O Brasil território e sociedade no início do século XXI. Editora
Record. São Paulo. 2001. p.19.
Roberto
Lobato, define território como sendo: “o conjunto de práticas e suas expressões materiais
e simbólicas capazes de garantir a apropriação e permanência de um dado
território por um determinado agente social, o Estado, os diferentes grupos
sociais e as empresas.” Corrêa, Roberto
Lobato. “Territorialidade e corporação: um exemplo”. In: SANTOS, Milton. Et
alli (orgs). Território
Globalização e Fragmentação. Ed. Hucitec, 1996. p. 251.
Marcelo
José L de Souza, relata em seu texto dois tipos de teritorialidade, a cíclica
ou móvel, e a territorialidade obsolescente. No caso da primeira, podemos
relatar como exemplo empírico as praias do Rio de janeiro. Nelas, a
territorialidade exercida muda de acordo com o horário do dia, podem ser idosos
praticando exercícios no alvorecer, ou mais tarde, mães passeando com seus
filhos em carrinhos de bebê, ou ainda aqueles que preferem “tostar” durante o
resto do dia, desafiando o aparecimento de câncer em seus corpos. Já como um exemplo
de territorialidade obsolescente, podemos citar a zona portuária, que a muito
tempo é preterida por outras áreas, constituindo assim um quadro de imóveis
abandonados, abrindo espaço para a degradação humana: “Outros grupos sociais, como
gangues de rua constituídas por adolescentes e jovens, podem apresentar
territorialidades similares à prostituição, ao menos no que diz respeito ao
caráter de grande mobilidaed dos limites territoriais.” SOUZA,
Marcelo José Lopes de. “O território: sobre espaço e poder, autonomia e
desenvolvimento” In: CASTRO, I. et alli (orgs). Geografia: Conceitos e temas. Editora
Bertrand Brasil, Rio de janeiro. 1995. p. 88-91.
Portanto,
assim como foi afirmado no início e durante o trabalho, “território” é um
conceito que exige constante verificação e atualização histórica. Sendo o
“território” definido pela territorialidade nele exercida, e a territorialidade
definida pelos atores sociais que compõe tal área, chegamos a conclusão que o
estudo de cada território deve ser feito independentemente, levando em
consideração as escalas de análise, para que nossas abordagens, de cientistas
sociais, não sejam incompletas ou errôneas.
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