Violência Urbana, da LSN e Ditadura Militar até as
facções criminosas.
Considerações sobre a Doutrina de
Segurança Nacional e a Ditadura: Devido a resurgência de
movimentos de esquerda no país, o estado golpista revolucionário, para garantir
o a atuação legal de seus atos, promulga em 13 de dezembro de 1968 o AI-5. A
Doutrina de Segurança Nacional dizia, a grosso modo, que as forças militares
agora não eram só responsáveis pela segurança contra ataques do exterior, sendo
que ataques –leia-se de movimentos de cunho esquerdista– poderiam ocorrer de
dentro do país. As forças armadas agora tornam-se responsáveis pelo
policiamento do país, interna e externamente, em tudo que se diz respeito a
ameaças ao modelo capitalista implementado, baseado no alinhamento aos
interesses estadunidenses.
O
presídio Cândido Mendes (“Caldeirão do Diabo” ou “Paraíso” ):
Construído em Ilha Grande, na
década de 1920, abrigou personalidades famosas como Graciliano Ramos, preso por
discordar da ditadura varguista (1936).
·
Falange da Zona sul
·
Falange da Coréia
·
Falange da Zona Norte (do Jacaré): é a maior do presídio.
·
Flange dos “Independentes”: Mantém acordos com a Falange do Jacaré.
·
A violência dentro dos presídios: A violência
dos presídios começa já na chegada dos novos presos, onde um informante de
alguma facção, trabalhando geralmente em serviços de confiança do presídio
–como a faxina, ajuda os guardas penitenciários a receber os novos presos. Este
preso de “confiança” analisa, com o olhar, rapidamente o novo preso, decidindo
se ele vai poder servir para soldado, mulher ou mesmo para nada. Se soldado,
ele será rapidamente impelido a se integrar ao quadro de uma das facções,
fortalecendo o grupo. Se visto como “mulher”, este será já na primeira noite
currado por cinco outros presos, no dia seguinte a vergonha de informar o
estupro sentenciará novamente outro violentamento, e assim ocorrerá durante
toda a semana, até que novo preso resigne-se a ser a “mulher” de determinado
grupo de presos. Geralmente, os escolhidos para ser “mulhereszinhas” são homens
com a pele lisa, sem cicatrizes ou manchas, que não apresentam resistência na
hora de serem revistados pelos guardas. Se esse novo preso tiver alguma
“sorte”, virará “mulher” de apenas um preso, geralmente um entre os mais
poderosos. Ainda assim, existem aqueles que não servem nem para uma coisa, nem
para outra, esses são lançados no presídio à própria sorte, cabendo a eles
tentar se arranjar com o grupo que os aceite.
A nova
LSN: O artigo 27 do decreto-lei 898 de 1969, sobre assaltantes de bancos e
terroristas:
A nova LSN coloca como marginais “comuns”
todos aqueles que procedem em atentados ditos terroristas e assaltos a bancos.
Os militantes de esquerda, identificados com a ideologia comunista, são presos
como quaisquer assaltantes. Mesmo assim, os militantes são presos, e dentro do
“Caldeirão do Diabo”, são identificados como presos “políticos”. Os demais
assaltantes de bancos , também condenados pela nova LSN, ficam conhecidos como
presos “comuns”. A condenação de assaltantes de banco sobe de 10 anos para 24
anos. Atos terroristas também seriam punidos de prisão perpétua e, em caso de
ocorrência de morte, pena de morte. A tentativa do Estado é a de despolitizar
os movimentos de esquerda aos olhos do povo e dos organismos de defesa dos
direitos humanos internacionais, pois assim os presos políticos podem ser
tratados como comuns indo para os mesmos presídios. O intuito aí do Estado é o
de que as guerras acontecidas dentro dos presídios dêem fim aos presos políticos.
O
encontro dentro do presídio dos presos “comuns” e “políticos”, todos pela LSN: Ocorrem prisões de membros do ALN, MR-8, VPR, VAR-Palmares, PC do B
etc.
Jornais descrevem como são feitos, passo
a passo, os assaltos a banco. Mesmo pessoas que não são envolvidos com
movimentos revolucionários de esquerda efetuam assaltos a bancos.
O Estado resolve juntar presos
“políticos” e presos “comuns” na galeria B, também chamado de “fundão”. Os
presos políticos, intelectualizados e filhos da classe média, com medo da
violência, fazem tanto “barulho” que conseguem a construção de uma parede de
alvenaria, com um grande portão no meio, separando os “políticos” dos “comuns”.
Esse ato não é bem recebido pelos presos “comuns”
·
A prisão do Padre Alípio (APML): O padre,
formado em história e filosofia, insatisfeito com a postura da Igreja Católica,
abandona-a e funda a Ação Popular Marxista Leninista, onde seguindo preceitos
revolucionários de esquerda, passa acreditar na “expropriação” de capitais dos
banqueiros, ou seja, o Padre Alípio torna-se também assaltante de bancos. Na
cadeia, Padre Alípio reorganiza os serviços médicos e assisntenciais.
·
A aproximação
dos “comuns” e dos “políticos”: As ameaças de ambas as partes vão
acalmando, uma vez que os presos “políticos” organizam-se em receber todo o
alimento trazido por seus familiares. Os “políticos”, compadecidos com a
situação de penúria dos demais presos, redistribuem os alimentos para todos sem
discriminação. Os presos “comuns”, alimentados pelos “políticos” e admirados do
grau de organização entre os “políticos”, que defendem que os presos não podem
se agredir, começam a trilhar uma aproximação sem retorno.
·
Circulação de textos “subversivos” na cadeia:
textos como a guerrilha urbana, de Carlos Mariguella, O manifesto comunista, de
Karl Marx e Friedrich Engels, A concepção materialista, de Afanassiev e Guerra
de guerrilhas, de “Che” Guevara, circulam em rodas de discussão onde muitos
presos “comuns” se integram aos “políticos”. Por outras vezes, os próprios
presos “comuns” criam seus grupos de discussão.

Willian
da Silva Lima, O Professor: Este teve pouca educação, sendo
contudo, extremamente inteligente. Willian torna-se amigo de Padre Alípio.
Muitos dizem que William tem leituras que faltam até a marxistas já formado,
como a de O Capital, de Marx. Em sua ficha não há acusações de crueldade,
estupro e tráfico de drogas. Willian nunca foi processado por homicídio.
Willian é o fundador da falange LSN,
que posteriormente se torna o Comando Vermelho, é portanto um dos oito presos
que formam inicialmente um núcleo de maior contato com os presos “políticos”.
Esse grupo coeso tem como princípio responder à violência das outras Falanges,
se preciso com mais violência.
·
“A disciplina”: “O inimigo está fora das
celas, aqui dentro somos todos irmãos e companheiros”: A guerra contra as outras falanges é uma questão de tempo. A Falange
LSN cria uma comissão de presos que alcança o reconhecimento oficial,
conseguindo até divulgar no exterior em 1975 uma carta denunciando os
mal tratos sofridos por detentos. Os presos passam a se reunir com
representantes oficias do Estado, apresentando uma lista de problemas e,
exigindo soluções. Enquanto isso, o núcleo da Falange LSN continuamente
aumenta, para quinze, trinta... Eles conseguem trazer par o contato com todos
os presos a Pastoral Penitenciária da Arquidiocese do Rio de janeiro
entre outros serviços sociais como advocacia e farmácia. Surge um time de
futebol e até um Jornal, intitulado “O Colonial” (referência a antiga
colônia de Dois Rios). Com tudo isso, aumenta ainda mais a adesão dos presos
aos LSN, que proíbem qualquer tipo de violência contra entre os presos e
oferecem todas essas vantagens. Nasce também um circuito de favores, que são
concedidos em troca da utilização da farmácia, da comunicação externa
através de advogados e simpatizantes dos presos. A Falange LSN controla também
o CCRI (Clube Cultural Recreativo do Interno), expandindo sua influência
a grande parte dos presos.
·
A “caixinha”: Existe ainda uma “caixinha” interna em que os presos podem depositar
seu dinheiro, ou parte dele, e, que serve de socorro, caso algum outro precise
sacar algum valor. É interessante para os presos recém chegados que depositem
algum valor nesta “caixinha” para assegurar sua posição no grupo. Para essa
caixinha também vem dinheiro oriundo de fora da penitenciária. Presos fugidos,
em seus assaltos, financiam fugas de companheiros ainda presos. Porém, essa
organização e financiamento, não acontecem com tal organização que exprimem a
imprensa da época, que diz que 10% do arrecadado em roubos vai para os
encarcerados. É na necessidade de conseguir mais dinheiro para o financiamento
dessas fugas que termina a fase “Heróica” do que será posteriormente o Comando
Vermelho.

Anistias:
Enquanto isso, a lei 6.683 – de 28 de agosto de 1979, concede anistia
política aos presos LSN “políticos”, porém, através de artifícios como
parágrafo 2º do artigo 1º, que diz que “Excetuam-se dos benefícios da anistia
os que foram condenados pela prática de terrorismo, assalto, seqüestro e
atentado pessoal”, o Estado consegue manter os presos “comuns” em ilha grande.
Os LSN “comuns”, são misturados com os demais presos da Ilha Grande ou mesmo
espalhados pelas prisões do Rio de Janeiro para que não gozassem da anistia
concedida aos “políticos”.
A Falange
LSN radical: 1. Morte a quem assaltar
ou estuprar companheiros; 2. Incompatibilidades trazidas da rua devem ser
resolvidas na rua, porque a rivalidade entre quadrilhas não pode perturbar a
vida na cadeia; 3. Violência apenas para tentar fugir e 4. Luta permanente contra
repressão e abusos. É lançado o Slogan que acompanha até hoje o Comando
Vermelho: “Paz, Justiça e liberdade”.
O
surgimento do Comando Vermelho: Com o
franco desenvolvimento da Falange LSN e com o “aprendizado” (ou por
observação ou por prática) adquiridos dos militantes de esquerda, os seus atos
dentro e fora do presídio começam a incomodar as elites dirigentes, que tem
suas opiniões divulgadas na impressa, esta por sua vez cobra mais rigor do
Estado no desbaratamento destes movimentos que ela julga ser de influência
comunista ou filocomunista. A Imprensa (TV Globo, O Dia e O Globo) se
esforçam no sentido de identificar em seus meios de comunicação as práticas
marginais da Falange LSN dentro e fora da penitenciária Cândido Mendes com
práticas que diziam ser terroristas dos movimentos de esquerda. Como as forças
oficiais de segurança pública não conseguem coibir tais atividades, as
cobranças da imprensa se acentuam e, o O Globo, fazendo as analogias
necessárias para que os leitores acreditassem que a Falange LSN era na verdade
mais um dos tantos movimentos terroristas de esquerda, cria uma alcunha para a
falange LSN: [ora, em termos militares, a classificação de “comando” se dá a
determinado grupo unido que consegue neutralizar outro. Logo a imprensa, que
cria e destroi mitos, utiliza-se dessa nomenclatura. E ainda, queriam
identificar essa ameaça aos grupos terroristas de esquerda [e aí traçar
associações com a cor dos países e partidos de esquerda] porque não chama-los
de “Vermelho”] “Comando Vermelho”. Com o tempo, policiais começaram a se
utilizar do termo CV, pois dava algum status prender um membro do CV. Bandidos
que jamais participaram de ações com pessoas ligadas aos LNS “comuns”, para
garantir-se dentro da cadeia, diziam-se membros do CV. Assim essa alcunha foi
ganhando força até fixar-se.
A
guerra: na tentativa de evitar a guerra. Membros dos
LSN “comuns”, organizam uma fuga junto de elementos de quadrilhas diferentes.
Contudo a fuga fracassa e os quadrilheiros, para mostrar força, assassinam um
bode-expiatório. Os LSN “comuns”, agora premidos por um claro desrespeito as
suas regras, vê a guerra como inevitável. Com amplo apoio da coletividade
carcerária, 6 dos mais fortes quadrilheiros são mortos, 30 prometem agora mudar
de comportamento e 20 pedem “seguro de vida”, sendo transferidos para outros
presídios. Agora a cadeia estava nas mãos de um só grupo, que expande sua
influência e prestígio para as demais cadeias. Mais tarde, suas falanges
rivais, as Falanges do Sul e Coréia unem-se para combater o Comando Vermelho,
formando o Terceiro Comando[1].
A
tentativa do Estado de acabar com o Comando Vermelho: Na tentativa de acabar com o Comando Vermelho, o Estado decide separar
os integrantes da facção criminosa. Quinze líderes são remanejados para outras
penitenciárias, contudo, o intuito do Estado, de desorganizar a liderança do
Comando Vermelho, faz, na verdade, que os preceitos de união, luta por melhores
condições de vida na prisão e organização entre os presos se disseminem em todo
os Estado, sendo exportado até para São Paulo, onde eclode o PCC.
Em
fim, o envolvimento com as drogas: Um assalto a
banco, ao contrário do que a imprensa diz, não dá muito lucro. É preciso uma
quantidade grande de pessoas para realiza-lo e o valor “expropriado” nunca é
tão grande quanto se é noticiado. Dividindo o valor pelos comparsas, pouco
sobra para o envio para a “caixinha”, que tinha o intuito de financiar as fugas
das cadeias. É a hora, por volta do ano de 1979, em que o Comando Vermelho cai
nas graças do plano de Pablo Escobar e o Cartel de Medelin. A operação conhecida
como “Natal de Neve”, que fornece cocaína e maconha quase a preço de custo. O
gasto com “arrego” aos policiais é baixo e o investimento em armamentos é ainda
menor. Essa conjuntura faz com que o Brasil deixe de ser apenas a rota de
passagem das drogas para a Europa e cria um grande número de consumidores no
país, gerando lucros fabulosos. Hoje estima-se que o Brasil seja o segundo
maior consumidor de drogas do mundo. Para entender o porque do envolvimento do
Comando Vermelho, que precisava de dinheiro para continuar a financiar fugas e
sua influência na cadeia, com as drogas, é preciso saber que um milhão de reais
investidos no tráfico de drogas, gera em quarenta dias 40%, transformando-se em
1,4milhões de reais. Ao contrário da Poupança, que em um mês, gera apenas –no
máximo- 1% de juro. Começa aí a história do Comando Vermelho como ele é hoje.
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Em setenta porcento dos
crimes violentos, há o envolvimento de drogas.
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A ONU estime que a
movimentação de financeira do tráfico de drogas, esteja entre 600 e 800 bilhões
de dólares. Estima também que exista cerca de 144 milhões de consumidores de
drogas. (dados de 2001).
·
Segundo BC, são efetuadas
200 remessas diárias de dinheiro ao exterior, cerca de 63.400 por ano,
descontando os sábados, domingos e as transações por internet e telefone.
·
Segundo a reportagem do O
Globo, de 21 de junho de 2002, o Estado já gasta até 44% dos 18 bilhões de seu
orçamento em despesas relativas a segurança como pagamento de indenizações,
compra de equipamentos, blindagens...
[1] A
formação do Terceiro Comando acontece já durante a Segunda geração do Comando
Vermelho, quando traficantes como Escadinha e Gordo são presos, por volta do
ano de 1981.
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