Caracterização e elaboração sobre o tempo e o
passado na Grécia, desenvolvendo o texto a partir das noções de mito, memória e
tradição.
A historiografia grega se
divide em duas fases; a primeira, chamada de fase heróica e a segunda,
considerada fase pós-heroica ou o tempo dos homens e o tempo dos deuses.
Segundo Finley, o
relacionamento dos gregos com o passado acontece na esfera do mito e na
tradição épica baseada predominantemente na memória. A narrativa histórica não
era sequer considerada como séria, digna de reflexão.
Os filósofos da Grécia antiga
preferiam a poesia épica a narrativa histórica, pois segundo eles, esta tratava
do particular, enquanto aquela dizia respeito de verdades universais.
A sociedade grega encontrava a
explicação para si mesma através dos mitos, utilizados para criar noções de
moralidade, ética, nobreza etc. A importância do mito em si era maior que nas
suas supostas lições. A relação dos mitos com o tempo linear era inexistente. O
mito encontrava seu lugar nos tempos imemoriáveis, na era heróica, no tempo dos
deuses. O tempo dos homens se misturava com o tempo mítico na tradição épica. A
característica comum entre esses tempos é a atemporalidade, muito comum na
noção de tempo cíclico.
O relato mítico é transmitido
essencialmente através da oralidade. No tempo dos homens, a tradição épica
acompanha os mitos em suas principais características, não obstante os fatos
narrados eram reconhecidos como base concreta da poesia épica. Os heróis e
personagens não podem ser analisados na concepção moderna de história; eles não
sofrem ação do tempo. O texto cita o exemplo de Ulisses, em seu retorno para
casa após vinte anos. Em parte alguma do poema épico, vem relatada que Ulisses
ou sua mulher Penélope, progrediram ou degeneraram.
O passado só vem a sofrer algum
tipo de cronologia a partir de Heródoto, no terceiro quartel do século V. Tudo
o que aconteceu antes, continuou como estava quando ele começou seu trabalho, o
passado histórico continuou sendo empregnado de elementos míticos. A própria
composição do passado era oriunda de elementos selecionados através de uma
memória coletiva, motivada pelo interesse comum. A confiabilidade não era
necessária, o importante era a aceitação. O passado pós-heróico servia de base
para legitimar a sociedade grega e a narrativa épica recriada oralmente estava
sujeita a elementos contemporâneos ao narrador.
Documentos como os códigos
legais e os regulamentos eram registrados de alguma forma, mas não havia
arquivos adequados, e estes em sua maior parte se perderam. Essa combinação de
fatores negativos –ausência de anais, a indiferença dos poetas e filósofos e
perda de documentos públicos- é irrevogável. Embora os gregos já possuíssem mão
de obra para investigar o passado, faltou-lhes interesse, característica bem
diferente da nossa sociedade atual.
Os gregos mantiveram a sua
cultura através da a tradição oral, que teve por resultado um passado mítico
baseado em elementos díspares que diferenciam em caráter e precisão (factual),
e cuja a ordem (factual) remontava a períodos de tempo bastante esparsos. Não
tinha por objetivo transmitir o passado mas sim o criar.
Essa
tradição oral que foi mantida viva até os tempos em que se tornou comum
registrar a história, permitiu que Tucídides e outros historiadores tomassem
nota de muitos acontecimentos. Num mundo desprovido de qualquer autoridade
central, política ou eclesiástica, e repleto de interesses políticos regionais
separados, muitas vezes conflitantes, essa etapa ajudou a determinar os textos dos
relatos, criando uma versão autorizada. A tradição é desde então passada
através de pessoas que tem funções específicas de transmiti-las, essas pessoas
precisam fazer com que a história seja aceita pela sociedade, mesmo tendo
veracidade ou não, é a tradição que mantém a sociedade unida entre
características comuns. A tradição funciona e precisa funcionar; caso contrário
a sociedade deixaria de existir.
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