V - A Escola de Atenas[1]
Pré-Socráticos ou filósofos da
natureza; algumas escolas
Qual é a causa última,
o princípio supremo de todas as coisas? Tales de Mileto. Citado
por Aristóteles
Numa busca por uma explicação lógica (Cosmologia) dos fenômenos naturais,
os primeiros filósofos logo se perguntaram quais seriam os princípios geradores
de tais fenômenos. Qual seria então a última instância de questionamento? A
causa última ou o princípio de tudo? O que seria o princípio de todas as
coisas?
Era importante tentar responder usando alguma lógica, algum raciocínio,
deixando os mitos de lado. Variadas foram as proposições, mas todas concordavam
que o Princípio (arkhé) seria um
elemento natural (physis), daí esses primeiros
filósofos também serem chamados de físicos. Eles concordavam também que a arkhé seria imperecível, eterna,
imortal. Esses filósofos são conhecidos como os pré-socráticos.
A Escola Jônica
Tales (640 – 545 a.C.), que viveu em Mileto, na Jônia, região da Ásia
Menor é considerado o primeiro filósofo. Seus seguidores formaram o primeiro
grupo de pensadores, conhecido como a Escola Jônica. Sua resposta não é uma
novidade para nós, mas podemos refletir sobre o quanto é genial dizer isso
primeiro: “Tudo é água” ou como em
outras traduções, “Água é o princípio de
todas as coisas”.
Anaximandro (610 – 547 a.C.), como um bom aluno filósofo, discorda de seu
professor, dizendo não ser possível explicar tudo a partir da água. Como
explicar as rochas, o espaço sideral, o sol...? Anaximandro aponta que o
princípio do Universo é Ápeiron, ou
seja, indeterminado, algo que está em movimento perpétuo.
Anaxímenes (585 – 525 a.C.), foi adiante, concordou com Anaximandro
quanto a ápeiron, mas apontou que o
ar condensado pode se transformar em água, se ainda mais condensado, pedras. Apontou
também que o ar quando rarefeito, propicia o fogo... Segundo Anaxímenes,
portanto, o ar é a arkhé.
Heráclito (540 – 480 a.C.), conhecido como O obscuro, por conta da sua forma enigmática de escrever, dá um
salto no pensamento pré-socrático e propõe metaforicamente que o princípio
criador é o fogo. Segundo ele, tudo se acende, queima e apaga em sua medida.
Heráclito diz que o princípio de todas as coisas é um eterno De Vir, ou seja, tudo está sempre em
movimento, o princípio de tudo está sempre por vir.
A Escola Pitagórica
O filósofo Pitágoras (570 – 587 a.C.), que viveu na ilha de Samos, propôs
que nada existiria fora de sua devida proporção. Ele e seus alunos –que também
acreditavam na imortalidade da alma e na reencarnação em outros corpos humanos
e de animais (metempsicose)–
apontavam que para entender o princípio de tudo era necessário estudar as
relações matemáticas entre as coisas do universo. Ao criar um método de
explicação do mundo baseado em números, chamando-o de máthēma, ele diz: “Tudo é número”.
Escola Eleata
Parmênedes de Eléia (515 – 450 a.C.), escreveu um poema conhecido como Sobre a Natureza, onde aponta dois
caminhos possíveis para o homem: o caminho da verdade (alétheia) e o caminho da opinião (doxa). Enquanto que para os gregos a doxa designava um caminho contrário ao da verdade, pois mostrava
pontos de vista individuais, sem valor universal, a alétheia seria o caminho pelo qual o homem chegaria à conclusão de
que tudo que é, é, e não pode deixar de
ser. Parmênedes quer dizer que tudo que existe em essência, continuará
existindo em essência, mesmo que mude em aparência. Desta forma, a sua máxima, o ser é e o não-ser não é, aponta que tudo
que existe, existe e continuará a existir: ser;
essência. E tudo que não existe (não-ser),
não existirá jamais: não-ser.
Zenão (334 – 226 a.C.), que também viveu na mesma cidade de Eléia,
dedicou-se a tentar refutar os pensadores que desacreditavam seu professor,
Parmênedes. O conhecido paradoxo de Zenão,
que visa afirmar que o ser é, e não
pode deixar de ser, aponta que não existe
movimento.
Escola Pluralista
Os pensadores dessa escola acreditavam que o princípio de todas as coisas
não é único, mas sim plural, variado. Demócrito de Abdera (460 – 370 a.C.) e
Empédocles (490 – 430 a.C.), são os mais destacados exemplos desta escola de
pensamento. Demócrito disse que tudo que existe no universo é formado por
pequenas partículas indivisíveis, as quais chamou de átomos. A união destes, que
se movimentam em velocidades diferentes, produziriam choques e uniões que criariam
coisas diferentes.
Empédocles de Agrigento (490 – 430 a.C), por sua vez, defendeu que tudo
se origina da união proporcional ou não do que mais tarde ficou conhecido como
os quatro elementos: terra, fogo, ar e água. Isso significa que tudo que existe
tem em sua essência os quatro elementos, cada qual com a sua porção maior que a
caracteriza.
O pensamento dos pré-socráticos perdurou durante bom tempo, até que as
cidades gregas se desenvolveram ainda mais, pressionando as elites por mudanças
sociais e dando espaço para o surgimento de pensadores que vão aprofundar suas
reflexões sobre o mundo. São intelectuais que vão deslocar a natureza e colocar
o homem no centro das explicações sobre o mundo. Estes são os Sofistas e,
notadamente, o patrono da filosofia: Sócrates.
Os Sofistas e Sócrates
O homem é a medida de
todas as coisas. Protágoras
Só sei que nada sei. Sócrates
O primeiro grupo de pensadores que vão rejeitar as reflexões cosmológicas
dos pré-socráticos são os sofistas.
Sofista significa, literalmente, Sábio. Eles ficaram conhecidos na história por
se apresentarem como donos do saber, homens de oratória excessivamente
adornada, enfeitada, vista por muitos como enganadora. Apesar da contradição,
posto o que escrevemos acima sobre o significado do termo filosofia e o significado de sofista,
estes também ficaram conhecidos como os primeiros filósofos do período
socrático.
Como descrevemos anteriormente, os séculos VII e VI antes de Cristo
apresentaram as condições materiais necessárias ao surgimento da filosofia. São
elas: as viagens marítimas, a invenção da moeda, da escrita, da política e o
desenvolvimento do comércio e da vida urbana. Ressaltamos que até então existia
na Hélade um ideal moral e estético, formado pelas famílias aristocráticas, de
que o jovem deveria ser bom e belo. Bom, moralmente, com uma assegurada
formação intelectual, garantida por ouvir as histórias sobre os herois gregos
como Hércules, Aquiles, Teseu, Perseu, de poetas renomados como Homero, Píndaro
e Hesíodo. E Belo, esteticamente, por cuidar fisicamente do corpo, praticando
ginástica, jogos de guerra e dança, também a imitar os heróis da Ilíada e da
Odisséia. Assim, os aristoi, prefixo
que significa os melhores, aqueles que são por excelência e superioridade, formavam
os grupos familiares Aristocráticos
que comandavam as polis ou Cidades-Estado
gregas.
Com a mudança do eixo econômico do rural para o urbano, os ricos
comerciantes ansiavam e pressionavam a antiga Ordem social por maior participação
administrativa. A democracia na Grécia, bem como a ideia de cidadania e participação
de todos nas decisões políticas da polis
surgem neste contexto. Esses tais comerciantes, sem a fineza dos
aristocráticos, começaram a apostar em uma educação diferente para os seus
filhos. Pensaram que para atender aos seus interesses, os comerciantes
precisavam de homens de boa retórica (oratória e eloquência) capazes de
representá-los na praça pública, a ágora,
onde eram realizadas as votações e onde aconteciam as decisões políticas mais
importantes. Neste contexto, os intelectuais que se apresentavam como mestres
na arte de persuadir e dissuadir, defendendo posições diferentes, mas sempre
capazes de convencer pelas palavras, aparecem intitulados como Sofistas. Trata-se de uma mudança de
valores morais que torna a forma de falar bem em público (oratória) mais
importante do que o conteúdo do que se diz.
Os sofistas viajavam de cidade em cidade, vendendo seu saber a quem
pudesse pagar para desenvolver poder de convencimento. Usavam de trocadilhos,
pensamento sem lógica, jogos de palavras, de frases... tudo com o intuito de
impor qualquer verdade que precisassem demonstrar. A verdade para os sofistas
era relativa. Como percebemos, em suas obras, seus pensamentos estavam ligados
ao homem e a vida em sociedade. São eles, portanto, os responsáveis por forjar
o conceito de cultura, como formação
completa do indivíduo dentro dos quadros e tradições de determinada sociedade.
Alguns dos principais sofistas foram Protágoras (485 -410 a.C.), Hípias (460 –
400 a.C.) e Górgias (483 – 376 a.C.).
Em meio a esse movimento, um pensador se revolta com a prática sofista.
Sócrates, nascido em Atenas, provavelmente viveu entre 470 – 399 a.C., mas não
deixou qualquer escrito. Tudo que sabemos sobre ele são citações de seu
pensamento feitas por outros filósofos, especialmente, seu discípulo, Platão.
Sócrates, embora considerasse que a sua busca por saber era motivada pela
ignorância que afirmava ter diante dos mais variados assuntos, já era
considerado o homem mais inteligente de Atenas. Isso o motivou a ir até o
Oráculo de Delfos, onde muitos gregos acreditavam poder ter contato com os
deuses através de mensagens enviadas por intermédio de sacerdotes. Em
conformidade com o que foi fazer lá, ao chegar, encontrou e absorveu um dos
lemas do Oráculo: “conhece a ti mesmo” ou “conhece-te a ti próprio”. Indagando
sobre a sua condição, teria ouvido a resposta de que era mesmo o homem mais
sábio da Grécia pelo simples fato de saber de sua ignorância. A missão de
Sócrates desde então passou a ser o demonstrar aos outros a sua própria
ignorância e estimulá-los na busca pelo saber, como compete a cada filósofo.
O que os sofistas e Sócrates tinham em comum e o que os diferenciavam dos
pré-socráticos é a colocação do homem no centro das explicações dos fenômenos
do mundo. Enquanto os sofistas preocupavam-se com as relações humanas em
sociedade, não se importando com a verdade, pois diziam que ela não poderia ser
demonstrável (relativa), Sócrates defendia que a razão humana deve ser o ponto
de partida para buscar a verdade, que acreditava ser demonstrável.
Ao contrário dos longos discursos sofísticos, Sócrates usava um
instrumento interessante na sua busca pelo saber: o diálogo. Normalmente suas
conversas eram públicas, à moda de também instruir àqueles que assistiam suas
proposições. Ao dialogar, o filósofo utilizava-se de dois métodos, a ironia, colocando-se sempre como um
leigo ao questionar sobre os assuntos que o seu interlocutor acreditava saber. Desta
forma dissimulada, Sócrates envolvia aquele que se propunha a conversar com
ele, até o ponto em que começa a questionar os saberes do seu interlocutor.
Então, quem se dedicava ao diálogo com o filósofo, normalmente terminava por admitir
publicamente sua ignorância. Sócrates ficou conhecido como o questionador.
Seu outro método, por vezes complementar ao primeiro, chamava-se Maiêutica, que consistia em estimular o
outro a desenvolver, depois de jogado fora o conhecimento cristalizado que
julgava ter, as suas próprias ideias, de forma ordenada e lógica. Maiêutica significa parto, uma referência ao tirar de dentro dos outros o conhecimento
que a pessoa tem: um parto de ideias.
Sócrates oferecia seus préstimos a qualquer pessoa, mesmo escravos que
estivessem pelas ruas. Contudo, por sua fama de sábio, normalmente era
solicitado a conversar com grandes dignitários de Atenas, com os quais agiu
sempre da mesma forma. Isso acabou, como seu discípulo Platão apontou ao
escrever a Alegoria da Caverna, por levá-lo a morte, pois chefes políticos,
juízes ou mesmo homens de grandes posses, consideravam-se humilhados
publicamente após conversarem com Sócrates. O filósofo acabou condenado a se
matar bebendo um copo com cicuta, um potente veneno em sua época.
Segue abaixo um quadro resumindo as diferenças entre sofistas e Sócrates:
Platão e Aristóteles; vida e obra.
"A sabedoria consiste em ordenar bem a nossa própria alma" Platão
Oriundos das influências do mestre Sócrates, Platão e Aristóteles
versarão sobre os mais diversos assuntos, que são conhecidos como grandes campos de investigação filosóficos.
São eles: Lógica; Teoria do Conhecimento
(Epistemologia); Metafísica (Ontologia);
Ética (Filosofia da Moral); Política (Filosofia Política); Filosofia da Arte (Estética).
Nestes três filósofos, temos a maior parte do pensamento ocidental fundamentado
e por conta disso, durante todo nosso trabalho eles serão citados.
Platão (aproximadamente 428 - 348
a.C.) era filho de uma tradicional família aristocrática, mas o seu encontro
com Sócrates, aos 20 anos, assim como o processo que levou seu mestre a morte, mudou
a sua vida. Tendo alguma semelhança com a antiga Ordem, Platão defendia que as
cidades deveriam ser governadas pelos melhores. Mas não se trata dos
“melhores-mais-ricos”, e sim, dos melhores intelectuais, os filósofos. Os
filósofos deveriam ser reis ou os reis deveriam se tornar filósofos. Somente
desta forma haveria justiça, posto que o filósofo, como um sábio, saberia
julgar o que é bom. Se isso não acontecesse, as Cidades-Estado ficariam
submetidas aos sentimentos de cada povo ou sujeito a quem estivesse no poder:
se sentisse raiva, cólera, fúria, poderia se transformar em uma tirania; se
igualdade, fraternidade e solidariedade, uma democracia; se ânsia pela riqueza
e egoísmo, uma timocracia e se prevalecesse o sentimento de grupo, familiar,
uma oligarquia.
Segundo ele, a sociedade deveria ser dividida em três classes: os
produtores, os guerreiros e os filósofos. Cada qual com sua função de trabalho
bem definida. Trabalhos manuais e que exijam pouco conhecimento, defesa militar
do Estado e administração dele.
Platão fundou em Antenas uma escola destinada a formar intelectuais que
poderiam dirigir qualquer Estado, conhecida historicamente como Academia. Um traço de sua origem
aristocrática aparece aqui. A Academia tinha no pórtico de sua entrada os
seguintes dizeres: “Não entre aqui quem
não souber geometria”, numa clara referência a um conhecimento que o
aspirante à estudante já deveria ter. Além disso, na Academia, também era uma preocupação
o cuidado físico, sendo as atividades em ginástica do corpo, obrigatórias. O próprio
nome Platão seria um apelido dado graças aos seus ombros largos e porte
atlético, sendo Aristócles sua verdadeira alcunha. A frase Mente sã em corpo são é dele.
O cerne da filosofia desse pensador é a separação do que é conhecimento
oriundo dos sentidos e o conhecimento oriundo da razão. Muito semelhante ao
pensamento de Parmênedes, Platão identifica a doxa (opinião que não conduziria a verdade) aos sentidos. O tato, o
paladar, o olfato, a audição e a visão podem conduzir à percepções falsas do
que é a verdade. Para o filósofo, a única forma de não se enganar e atingir um saber
verdadeiro seria basear o saber no conhecimento puramente racional (episteme) ou nas idéias puras.
Desta forma, Platão divide o conhecimento que é oriundo do Mundo em Sensível e o do Mundo Inteligível. O Mundo Sensível com
os saberes oriundos dos sentidos humanos, considerados enganosos. E o Mundo
Inteligível ou Mundo Ideal, onde Platão com sua Teoria das Ideias, afirma que o conhecimento verdadeiro sobre
alguma coisa vem da ideia pura, sem influência dos sentidos. Enfim, para esse
filósofo, o corpo era um obstáculo para o conhecimento, ou como dizia: “o corpo é o cárcere da alma”.
Segundo Platão, apenas a alma tem contato com o conhecimento verdadeiro,
pois não se relaciona com os sentidos. A alma é incorpórea, imaterial e
imortal. Ele acredita, do mesmo modo que Parmênedes, na metempsicose. A alma se
desprenderia do corpo a cada morte, voltando a encarnar em outro humano ou
animal irracional, num ciclo que impede a realização plena espiritual do homem.
Daí o fato de Platão afirmar que o
filósofo deseja morrer, para poder libertar sua alma do corpo.
Por essa opção, Platão radicalizou sua posição de busca pela verdade ao
acusar os artistas de mentirosos. O termo Estética,
que surgirá apenas no século XVIII de nossa era cristã, não era utilizado na
Grécia antiga, porém, usada como sinônimo de Filosofia da Arte, tendo por significado experiência sensível, nos ajuda a entender porque Platão quis
expulsar os artistas da cidade. Como a profissão dos artistas, está ligado a
ideia de artifício ou artificial, Platão vai identificar a arte a uma cópia da
cópia da realidade vista por nossos olhos (mímesis),
capaz apenas de enganar o homem no processo de busca do conhecimento
verdadeiro. É como se homem vivesse nas sombras, na escuridão oferecida pelos
sentidos.
Na conhecida Alegoria da Caverna,
Platão conta-nos que alguns seres humanos, acorrentados e sem poder mover a
cabeça, no interior de uma caverna desde seu nascimento são obrigados a olhar
para o fundo da caverna. Eles nunca viram outros seres humanos e pela força das
correntes, nunca, sequer, se viram. A saída da caverna fornece a eles apenas um
diminuto raio de luz. E numa sequência, atrás deles existem um muro alto, um
corredor por onde passam outras pessoas a carregar coisas sobre suas cabeças e
ainda uma fraca fogueira, porém, capaz de projetar as sombras das pessoas que
estão passando no corredor. As sombras são projetadas para o fundo da caverna,
tornando-se as únicas coisas que os prisioneiros veem durante sua vida.
Apesar de não se veem, os prisioneiros se comunicam, dando nomes a eles
mesmos e as sombras que estão vendo na parede do fundo da caverna. Imaginam que
aquilo que ouvem são sons vindos das sombras e não das pessoas ou das coisas
que carregam por trás do muro.
Segundo o filósofo Platão (428 ou 427-348 ou 347 a.C.), essa seria a
condição que os homens se encontram graças às ideologias, aos valores e as
ideias que, por muitas vezes, nos levam a uma postura preconceituosa, de crenças,
de pré-julgamentos e baseada nas aparências. O mundo desses prisioneiros
baseia-se apenas no que veem, no que falam e ouvem, ou seja, nos sentidos, num
mundo sensível. Contudo, esta não seria a condição da humanidade, posto que
somos capazes de conhecer muito mais do que sombras, e, principalmente, porque
somos capazes de pensar, raciocinar, buscar a essência das coisas e produzir
novos conhecimentos. É da condição humana o ‘querer saber’, o ‘buscar o
conhecimento’.
Mas o Mito da Caverna, como
também é chamado, não termina por aqui. Revoltado com sua condição, um dos
prisioneiros começa a forçar as correntes e barras que o prende. Seu esforço
intenso o leva a soltura de grilhão após grilhão. Ele percebe o que está a sua
volta, porém decide ir em direção ao feixe de luz. Enfrentando a dor de nunca
ter usado seus músculos, ele escala o muro e enfrenta as dificuldades de passar
por um apertado caminho até a saída da caverna. Ao sair, tem a sua visão
ofuscada pela luz intensa do sol. Quer voltar para o interior seguro da
caverna, mas se sente indisposto por conta do difícil caminho que teria de
enfrentar. Acaba por se acostumar com a dor nos olhos e no corpo e fica do lado
de fora da caverna.
O ex-prisioneiro se vê admirado com as cores, as formas que nunca havia
visto, as pessoas, os novos assuntos, se espanta com os novos conhecimentos,
mas, por um momento, se pergunta qual seria a realidade: o interior ou o
exterior da caverna? A felicidade que experimenta ao conhecer, responde e
decide por ele: nunca mais querer habitar a caverna, mas não pode deixar de
lamentar a sorte de seus companheiros que continuam na escuridão da ignorância.
O ex-prisioneiro, mesmo maravilhado com o que acaba de conhecer, escolhe
voltar à escuridão para resgatar seus companheiros e levá-los a luz. Depois de
passar pelo difícil caminho até o espaço em que estava confinado, tenta contar
aos prisioneiros sobre as coisas que viu, porém eles o ignoram e debocham das
suas palavras. Mesmo assim o liberto insiste em levá-los à luz, mas os prisioneiros
preferem a segurança dos conhecimentos estabelecidos e terminam por espancá-lo
para que silencie.
Os escritos de Platão seguem o modelo de Sócrates, seu mestre; o diálogo.
O número exato de livros escrito por Platão é uma incógnita, pois muitos deles
não têm confirmação de autenticidade. São mais de 30 diálogos onde Sócrates está
sempre como um dos personagens centrais. Segue aqui alguns dos mais conhecidos:
Acerca da Linguagem (Hípias Menor ou Acerca da Falsidade ; Protágoras ou Os
Sofistas; Górgias ou Acerca da Retórica; Crátilo ou Acerca da Retidão dos
Nomes; Fédro ou da Beleza); Outros
Diálogos (Hípias Maior ou Acerca do Belo; Apologia de Sócrates; Criton
ou Acerca do Dever; Menon ou Acerca da Virtude; O Banquete ou Acerca do Amor; Fédon
ou Acerca da Alma; A República ou Acerca da Justiça ; Teeteto ou Acerca da
Ciência; Parmênedes ou Acerca das Idéias; O Sofista ou Acerca do Ser; O Político
ou Acerca da Realeza; Críticas ou Acerca de Atlântida);
Aristóteles (384 – 322 a.C.),
aluno de Platão, nasceu em Estagira e era conhecido por ser o mais esforçado dos
alunos da Academia. Por lá passou cerca de vinte anos estudando. Com a morte do
mestre, Aristóteles acreditava que assumiria a escola, sendo, porém, ela dada a
um parente de Platão. Insatisfeito com os rumos da Academia, Aristóteles fundou
o Liceu, onde por dez anos ficou a
frente. O sucesso de sua escola foi tão grande que chegou até a suplantar a
Academia de seu antigo mestre.
Aristóteles se distanciou substancialmente do pensamento de
seu mestre, ao aceitar além da alma, também o corpo como partes formadoras da
identidade do ser. Desta forma, ele afirma que a arte serve à educação dos
jovens gregos. De acordo com a qualidade de uma peça de teatro, o jovem grego
poderia ser influenciado a ser um homem corajoso ou covarde, moralmente bom ou
sem a vergonha necessária à vida em sociedade.
Sua filosofia admitia o conhecimento sensorial como uma
possibilidade de alcançar o conhecimento verdadeiro das coisas. Para ele
devemos basear nosso saber no Mundo Real,
pois não existe um mundo próprio das ideias. Elas surgiriam através do
intelecto humano que naturalmente usa os sentidos. Isso acontecia graças a filosofia
do estagirita de que tudo que existe tem uma substância que lhe é própria. São qualidades, dimensões, volumes,
elementos dos quais coisas são feitas.
A abstração, que
significa colocar à parte para estudo, nos daria as condições necessárias para,
através dos sentidos, chegar ao conhecimento daquilo que nos propomos a
analisar. É nessa abstração, que envolve o mundo sensível (material), que
Aristóteles funda sua Metafísica
(estudo do ser).
O filósofo aponta que para o estudo metafísico, necessitamos
entender três conceitos: Potência, Ato e Movimento. Por exemplo, podemos apontar uma grande pedra de
mármore, que tem potencial para ser uma estátua (potência). Para isso
precisamos de um artífice que trabalhe sobre o mármore (ato), para realizar o
processo de sua transformação (movimento).
Ainda no pensamento aristotélico, envolvendo-se com o de estudo
do ser, temos sua Filosofia da Moral
ou Ética, que tem como ponto central o
meio-termo nas ações humanas, a prudência e reflexão antes da ação, este
seria a principal qualidade de uma pessoa virtuosa. Por uma definição frouxa de
ética, entendemos que ela é o estudo da vida prática humana, suas ações e seus
efeitos, o que é considerado bom ou mal. Para o estagirita, o ser ético se
constitui nas suas ações, que ocupam o campo das deliberações, das escolhas. Segundo
o filósofo, o homem que faz qualquer coisa por excesso apresenta um vício,
tanto quanto aquele que deixa de fazê-lo. O homem prudente deve ser capaz de
discernir entre o que é bom ou mal para si, tomando assim a decisão adequada,
considerada virtuosa por todos. Para Aristóteles, o agir de forma ética conduz
o indivíduo à felicidade. Contudo, a felicidade da sociedade, do coletivo,
exige uma busca diferente, que deve ser realizada pelas searas da Política.
Neste campo, o estagirita afirmava que o homem é um animal político. Compreenda que ele está colocando
todos os homens em pé de igualdade através de uma característica comum. Por
isso, em sua obra, a defesa da democracia, ao contrário de seu mestre Platão,
se torna tão evidente. Capaz de refletir sobre o que é melhor para sua
sociedade, o homem, o ser político, deve estar em meio a polis ou
Cidade-Estado, lugar dos diálogos e da participação nas decisões políticas.
Em qualquer que seja a área de trabalho, Aristóteles toma por
base de todas as logias, ou seja,
todas as ciências que já são estudadas e que surgirão futuramente, a lógica. Esse novo saber seria
pré-requisito para qualquer ciência, ou reflexão filosófica. Trata-se de
sistematizar as proposições feitas em argumentos lógicos, encadeados. Lembremos
que como aluno de Platão, que por sua vez era aluno de Sócrates, o estagirita
atacava a postura sofista de fazer prevalecer forma sobre conteúdo. Ele atacou
diretamente a perspectiva do argumento de autoridade, que vinha daquele que bem
falava sem necessariamente expor sentido na sua explanação. Aristóteles propôs
então o silogismo, que funcionava da
seguinte forma: uma premissa geral, uma premissa particular e uma premissa
conclusiva. Vejamos dessa assim:
Todo homem é mortal
(Premissa Geral)
Sócrates é um homem
(Premissa Particular)
Sócrates é homem, logo
Sócrates é mortal (Premissa Conclusiva).
Como outro conteúdo, mas a mesma forma:
Todo A é B
C é um exemplar de A
Logo, C é B.
Desta forma o pensador finalmente será capaz de construir um conhecimento
confiável, emitindo um conjunto de proposições logicamente concatenadas. Esse
seria um argumento lógico racional.
Algumas das obras de Aristóteles são: Escritos Lógicos ou Sobre a Linguagem (Órganon; Categorias; Poética; Retórica); Escritos Metafísicos (A Metafísica); Meteoros;
Mecânica; Parte dos Animais; Escritos
Éticos (Ética a Nicômaco; A Política; Os Econômicos; Cosntituição de
Atenas).
Percebemos assim que a Escola de Atenas, entre muitas outras coisas, nos
deixou a perspectiva de que a verdade não pode ser imposta, mas deve ser
demonstrada através de argumentos racionais. Também podemos presumir de seus
pensamentos que somos, nós seres humanos, capazes de compreender as leis
naturais do universo, sem precisarmos recorrer a explicações fantasiosas sobre
a origem das coisas. Aliás, o nosso próprio pensamento segue leis que devem ser
organizadas para podermos distinguir o conhecimento confiável do enganoso. E
finalmente, a perspectiva de que os homens são animais que naturalmente buscam
o saber, buscam a justiça e buscam a felicidade.
EXEERCÍCIOS PROPOSTOS
Como característica geral, os filósofos
pré-socráticos buscavam explicar os fenômenos naturais através da physis, ou seja, natureza primordial ou
princípio. Este princípio era, segundo eles, eterno, imperecível e imutável.
Contudo, suas teorias eram diferentes... A partir do quadro renascentista de
Rafael Sanzo, alguns filósofos são retratados, relacione seus nomes (à
esquerda) com as palavras que resumem suas teorias sobre o princípio criador (à
direita).
(a)
Tales (
) Átomo
(b)
Anaximenes ( ) Números
(c)
Anaximandro ( ) Ser imutável
(d)
Heráclito ( ) Fogo
(e)
Parmênedes ( ) Infinito (Áperon)
(f)
Pitágoras ( ) Ar
(g)
Demócrito ( ) Água
2. Marque apenas uma resposta. Qual dentre esses é
considerado o primeiro filósofo e qual a sua proposição quanto ao princípio de
todas coisas?
(a)
Pitágoras: “Tudo é número”;
(b)
Tales: “Tudo é água”;
(c)
Sócrates: “Tudo é dialética”;
(d)
Platão: “Todos os sentidos enganam”;
(e)
Aristóteles: “Tudo é ética”.
3. UFF – 2010 – Como uma onda - Lulu Santos e Nelson Motta
Nada do que foi
será/ De novo do jeito que já foi um dia/ Tudo passa/ Tudo sempre passará/ A
vida vem em ondas/ Como um mar/ Num indo e vindo infinito/ Tudo que se vê não é/
Igual ao que a gente/ Viu há um segundo/ Tudo muda o tempo todo/ No mundo/ Não
adianta fugir/ Nem mentir/ Pra si mesmo agora/ Há tanta vida lá fora/ Aqui
dentro sempre/ Como uma onda no mar/ Como uma onda no mar/ Como uma onda no mar
A letra dessa canção de Lulu Santos lembra ideias do filósofo
grego Heráclito, que viveu no século VI a.C. e que usava uma linguagem poética
para exprimir seu pensamento. Ele é o autor de uma frase famosa: “Não se entra
duas vezes no mesmo rio”.
Dentre as sentenças de Heráclito abaixo citadas, marque
aquela da qual o sentido da canção de Lulu Santos mais se aproxima.
(A) Morte é
tudo que vemos despertos, e tudo que vemos dormindo é sono.
(B) O homem
tolo gosta de se empolgar a cada palavra.
(C) Ao se
entrar num mesmo rio, as águas que fluem são outras.
(D) Muita
instrução não ensina a ter inteligência.
(E) O povo deve lutar pela lei como defende as muralhas da sua
cidade.
4. Metamorfose Ambulante - Raul Seixas
Prefiro ser/ Essa metamorfose ambulante/ Eu
prefiro ser/ Essa metamorfose ambulante/ Do que ter aquela velha opinião/
Formada sobre tudo/ Do que ter aquela velha opinião/ Formada sobre tudo... Eu
quero dizer/ Agora o oposto/ Do que eu disse antes/ Eu prefiro ser/ Essa
metamorfose ambulante/ Do que ter aquela velha opinião/ Formada sobre tudo/ Do
que ter aquela velha opinião/ Formada sobre tudo... Sobre o que é o amor/ Sobre
o que eu/ Nem sei quem sou/ Se hoje eu sou estrela/ Amanhã já se apagou/ Se
hoje eu te odeio/ Amanhã lhe tenho amor/ Lhe tenho amor/ Lhe tenho horror/ Lhe
faço amor/ Eu sou um ator... É chato chegar/ A um objetivo num instante/ Eu
quero viver/ Nessa metamorfose ambulante/ Do que ter aquela velha opinião/
Formada sobre tudo/ Do que ter aquela velha opinião/ Formada sobre tudo...
Qual filósofo pré-socrático pode
ter seu pensamento identificado com a música de Raul Seixas? Explique sua
teoria.
5. UFF –
2009 - Em seu diálogo A República,
Platão descreve na célebre Alegoria
da Caverna a situação de homens aprisionados desde a infância no
fundo de uma caverna e de tal forma que só podem olhar para uma parede em
frente sobre a qual se projetam as sombras de bonecos colocados atrás destes
homens. Um destes homens se liberta, sai da caverna e aos poucos se acostuma
com a luminosidade externa, começa a distinguir as coisas e por fim descobre o
Sol como a fonte da luz. Ele se dá conta, então, da ilusão representada pelas
sombras que ele e os outros tomavam como realidade. Exultante com sua
descoberta, ele retorna à caverna para relatar sua experiência, que é assim
narrada por Sócrates:
“Suponha que
esse homem volte à caverna e retome o seu antigo lugar. Desta vez, não seria pelas
trevas que ele teria os olhos ofuscados, ao vir diretamente do Sol? E se ele
tivesse que emitir de novo um juízo sobre as sombras e entrar em competição com
os prisioneiros que continuaram acorrentados, enquanto sua vista ainda está
confusa, seus olhos ainda não se recompuseram, enquanto lhe deram um tempo
curto demais para acostumar-se com a escuridão, ele não ficaria ridículo? Os
prisioneiros não diriam que, depois de ter ido até o alto, voltou com a vista
perdida, que não vale mesmo a pena subir até lá? E se alguém tentasse retirar
os seus laços, fazê-los subir, você acredita que, se pudessem agarrá-lo e
executá-lo, não o matariam?”.
Platão parece estar descrevendo a situação do
“filósofo” quando este pretende esclarecer os demais seres humanos sobre o que
ele pensa ser a verdade.
A partir desta narrativa de Platão, discorra sobre
qual o papel do “filósofo” no mundo contemporâneo.
6. UFF –
2009 - Na célebre pintura A Escola
de Atenas, o artista renascentista italiano Rafael reuniu os
principais nomes da filosofia grega, tendo ao centro do quadro as figuras de
Platão e de Aristóteles. Na pintura, Platão aponta com sua mão para o alto e
Aristóteles aponta para baixo. Deste modo, com estes gestos, Rafael estava
ilustrando a distinção entre a filosofia de Platão e a filosofia de
Aristóteles.

Indique
e discorra sobre a principal diferença entre a filosofia de Platão e a de
Aristóteles.
7. Filosofia adolescente
contemporânea
A noite, minha mãe e eu
estávamos sentados na sala falando de muitas coisas da vida... entre outras...
estávamos falando sobre o tema de viver; morrer.
Eu lhe disse: “Mamãe, nunca
me deixe viver em estado vegetativo, dependendo de máquinas e líquidos de uma garrafa”.
Se me ver nesse estado, desligue os artefatos que mantém vivo. PREFIRO
MORRER!!!.
Então, minha mãe se levantou
com uma cara de admiração... e desligou o televisor, o DVD, o cabo da Internet,
o computador, o mp3/4/5, o vídeo game, o telefone, me tirou o celular, o
notebook e me tirou todas as cervejas!!!!
Que droga!!!! Quase que
morro!!!!!
O Mito da Caverna, narrado por Sócrates
no livro VII da República, de Platão,
conta a história de seres humanos acorrentados no interior de uma caverna por
onde passa apenas um feixe de luz. Essas pessoas, geração após geração, com a
cabeça imobilizada voltada para uma das paredes, ouvem sons e vêem apenas
sombras de outras pessoas carregando coisas do lado de fora da caverna. Os
acorrentados dão nomes às pessoas e aos sons que ouvem, acreditam que os sons
são diálogos e que os instrumentos que as pessoas carregam são parte de seus
corpos (...).
Partindo do
princípio de que essas pessoas estão metaforicamente –e literalmente– na
obscuridade, e que você possa ser uma delas, descreva o que seria a sua saída
da caverna.
GABARITO
1. Solução:
G – F – E – D – C – B – A.
2. Solução:
B
3. Solução:
C
4. Solução:
Heráclito defende que o princípio de todas as coisas é um eterno De vir. Está
sempre em transformação, sempre se metamorfoseando.
5. Solução: Na alegoria da caverna, as
idéias principais estão nas oposições: “mundo sensível” – “mundo inteligível”,
“opinião” – “ciência”, “aparência” – “realidade” e outras análogas. O
“filósofo” é representado por alguém que se liberta das “aparências” e tenta
explicar a “realidade” para os outros, mas é hostilizado e ameaçado. O
candidato poderá então discorrer sobre a condição contemporânea do “filósofo”
ou do “sábio” e de seus conflitos com os outros seres humanos.
6. Solução: Na pintura de Rafael, o
gesto de Platão aponta para o “mundo ideal” e o de Aristóteles para o “mundo
real”. A interpretação de Rafael é evidentemente esquemática. O candidato
poderá expor suas próprias concepções sobre as diferenças entre Platão e
Aristóteles.
7. Solução: Nesta questão o aluno deve
demonstrar que entendeu a grande metáfora da Alegoria da Caverna, refletindo
sobre a vida e identificando nela as correntes que o prendem ao Mundo Sensível.
Fábio Souza Lima
[1] A Escola de Atenas é o nome da célebre pintura de
Rafael Sanzio, encomendada pela Igreja Católica no início do século XVI. Ela
retrata mais do que os filósofos nascidos em Atenas, retrata a grande
influência dos pensadores helênicos no pensamento ocidental.
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