Violência e criminalidade em Manguinhos - Rio de
Janeiro
O discurso advindo de alguém intimamente
relacionado com o exercício do poder ao mesmo tempo sugere a memória
histórica também é parte do fazer da história (VESENTINI, C. A., 1997: pp. 25-26).
INTRODUÇÃO – CONSIDERAÇÕES GERAIS, MÉTODOS E
OBJETIVOS
O
presente artigo, baseado no trabalho de monografia, intitulado O poder Vermelho da casa Amarela – O mito do Comando Vermelho em Manguinhos e no Rio de
Janeiro, entregue no segundo semestre de 2005, resume dois anos de estudo
acerca da temática de violência urbana e controle social. Tal pesquisa se desenvolveu durante os
anos de estudo realizados como bolsista da Fundação Instituto Oswaldo Cruz, e esteve
inserida no projeto História e Memória das Comunidades de Manguinhos, onde os
doutores Tania Maria Dias Fernandes e Renato Gama-Rosa Costa, coordenam o
levantamento e registro da memória dos moradores das treze comunidades que
compõem Manguinhos.
Nos
concentramos mais tenazmente neste estudo, na abordagem foucaultiana das Relações de Poder, abordando as
relações entre Estado/Indivíduo e Indivíduo/Indivíduo, como meio de
disseminação das ideologias que ligam as “ameaças vermelhas” do passado e do
presente, apresentando sempre a repressão como tábua de salvação. Essas
relações poderão ser aferidas no decorrer do texto, ao passo que as citações de
Poder, com “P” maiúsculo, se referirão sempre ao relacionamento do Estado para com o indivíduo e o poder, com “p” minúsculo, por sua vez, as relações individuais. O próprio
título de nosso trabalho, aproveitando a perspectiva que adotamos sobre a
definição de poder, ressalta que O poder
Vermelho, tem antes de tudo o seu V
maiúsculo por ser o poder que a facção criminosa Comando Vermelho se pretende e o p minúsculo, por demonstrar o que ele realmente ainda é, com
relação as funções e características intrínsecas ao um Estado Moderno brasileiro. Da mesma forma, casa Amarela, nos mostra a importância que os moradores de Varginha
relevam a cor amarela, pois,
quando ao revisitarem suas memórias sobre a comunidade, começam dizendo ...aquela casa Amarela, a bendita casa
Amarela...[1], adjetivando sempre com duas cores,
todas as suas memórias sobre a violência em Manguinhos, a partir daquela
pequena casa no meio da favela Varginha.
Nos
primeiros meses do ano de 2004, ao aprofundar os estudos sobre as Comunidades
de Manguinhos, através das entrevistas realizadas, nos deparamos com histórias
de violência contadas a partir de uma memória comum entre alguns entrevistados:
violência, Comando Vermelho, Estado, Varginha,
casa Amarela... Paralelamente ao levantamento
da memória dos atores sociais que compõem a identidade de cada uma das treze
comunidades do que a polícia tipificou como Complexo
de Manguinhos[2],
continuamos a levantar a história de tal casa, trabalhando com a idéia que os
moradores tinham de que a facção criminosa mais conhecida do país teria surgido
ali mesmo, bem no início da década dos anos 1980, na casa Amarela. Mais tarde, ao aprofundarmos nossos estudos com a
busca de fontes tradicionais como bibliografias, teses, periódicos e imagens,
pudemos perceber que a pequena construção teria servido como um posto avançado
de decisões que influenciaram não apenas o Complexo
de Manguinhos, mas todo o Estado,
quando os principais marginais[3] do Rio de
Janeiro, acuados pela grande repressão militar a crimes de roubo a bancos e
seqüestros, decidiram cambiar o rumo de seus negócios em direção ao então lucrativo
e fácil comércio ilegal de drogas.
Analisar,
portanto, as histórias a cerca da casa
Amarela, nos levou também a estudar a história de seus ocupantes durante os
anos 1980 e 1990, o que por sua vez, nos levou a épocas mais remotas, nos
forçando a um corte temporal que se inicia com século XX. Para entendermos o
tráfico de drogas em Varginha, iniciamos nossos estudos na década de 20, período
em que a região de Manguinhos foi designada a ser uma Zona Industrial, por
influência do urbanista francês Alfred Agache, o que levou a uma intensa
transformação da área através de aterramentos e retificações de rios. Estudamos
o terceiro quartel do mesmo século, para abordar o regime de exceção no Brasil,
em que os militares, apoiados pela parcela mais conservadora da sociedade,
chegaram ao Poder e levaram ao sistema penal, muitos militantes de esquerda e
bandidos movidos por interesses meramente pessoais.
Ao
abrir tanto nosso corte cronológico, por boa parte do século, mesmo tratando de
assuntos pontuais de nossa sociedade, nos pareceu também interessante realizar
uma análise social a partir do mito, no que diz respeito ao controle social e
as políticas sociais implementadas pelo Estado. Julgamos mais conveniente estudar as origens
do mito, baseando-nos na idéia de Catherine Backès-Clemente, ao afirmar que O mito revela o “antes” da história, mas
antes “havia” o mito!... ( BACKÈS-CLEMENT, C., 1988: 311). Desta forma, nos
utilizamos de não apenas nos relatos dos moradores de Varginha e na crença
popular de origem do Comando Vermelho,
mas também nas através de produções literárias que exaltaram e exaltam o
banditismo-social Hobin Hood.
O mito do Comando Vermelho em Manguinhos
e no Rio de Janeiro, é construído, portanto, com relatos e obras literárias populares,
demonstrando as retenções de nossa sociedade sobre o assunto que envolve a
ditadura civil-militar, comunistas, violência, tráfico de drogas, verdadeiros entes
sagrados, heróis, monstros... As origens do Comando
Vermelho, da Comunidade Parque Carlos Chagas e a utilização da casa Amarela para o tráfico de drogas,
bem como o discurso de repressão advindo de tais mitos, estão, portanto, no centro
deste trabalho.
Utilizamos a história oral e a análise
estrutural do mito do Comando Vermelho,
onde destacamos para sua composição, as memórias de atores sociais moradores de
comunidades carentes ou não, que contam histórias de verdadeiros Entes Sobrenaturais (ELIADE, M., 1972:
p. 11). que deram origem a um circuito de violência no Rio de Janeiro, baseado
no tráfico de drogas.
A História Oral, por se
prestar a diversas abordagens, caracterizando-se como multidisciplinar,
funcionou como um perfeito método para aferirmos, dentro da memória popular,
todo o conteúdo que buscávamos sobre a temática de violência. A proximidade que
conseguimos, ao entrevistarmos pessoas que participaram ou testemunharam
determinados acontecimentos e conjunturas, jamais se daria por uma abordagem
tradicional que contasse apenas com fontes bibliográficas, dissertações, teses,
jornais e imagens...
Quanto a Análise
Estrutural, respeitamos também seus estudos sobre os mitos, ao nos utilizarmos da
teoria Saussuriana no tocante a sua idéia de diacronismo e sincronismo. Segundo
Saussure, as narrativas orais se caracterizam pelo deslocamento de um lado para
outro, esquerda para a direita, formando um eixo diacrônico, o que possibilita
o estabelecimento de paralelos, de onde podemos realizar o estudo de evoluções
e mudanças nas classes sociais, no que diz respeito ao mito. Por outro lado, o
eixo sincrônico que caracteriza a estrutura de um mito como quase parado no
tempo, alheio às conjunturas, pois pensamos o mito do Comando Vermelho, cristalizado por obras jornalísticas e de
intelectuais ligados às classes dominantes.
Nossa sociedade, dividida
em classes, mostrou-se, dentro desta temática de violência urbana,
suficientemente pouco diversa, para que pensássemos em estudá-la com a
simplicidade de apenas duas visões antípodas, designadas pelo eixo diacrônico
(horizontal). Enquanto afirmam os jornais que as classes sociais brasileiras
são muitas, caracterizadas em A, B, C, D..., para nossa abordagem, podemos decompor
a sociedade brasileira naqueles que suficientemente enriquecidos e esclarecidos,
podem contar com os serviços de segurança particular e influem na maneira de
pensar e agir de toda a sociedade, e, aqueles que como na saúde e educação, não
contam com as garantias do Contrato Social[4],
e são alienados as idéias e valores dos que influenciam. Somamos a percepção
destas duas classes, para melhor análise deste trabalho, o antagonismo dos
militantes de esquerda e os civis-militares que sustentaram o regime de exceção
iniciado em 1964.
Em negrito e itálico na
coluna vertical esquerda do diagrama (eixo sincrônico) temos pontuações que
consideramos pertinentes para a nossa análise de controle social e violência,
horizontalmente (eixo diacrônico), assim como já apontamos, decompomos nossa
sociedade, nas seguintes classes: Ordem
Social e Padrão Marginal
(alienígena) ao Contrato Social. De
um modo geral, portanto, são estudados temas que se relacionam a vida de todas
as pessoas, residentes em comunidades carentes e faveladas ou não.
Quadro
X
|
Ordem Social
|
Padrão marginal (alienígena) ao
Contrato Social
|
Estado Moderno
|
Segurança
Pública / Lei de Segurança Nacional / Presente
|
Subversão de qualquer forma ao
Ordenamento Social / Ausente
|
Homens
|
Cidadão Ativo /
Self-Made-Mem, o Bem
|
Comunista / Filo-comunista / Favelado /
Bandido-Social / Robin Hood / Marginais / O Mal
|
Regime de Exceção
|
Revolucionários
militares / Heróis / Democratas
|
Comunistas / Marginais ao Contrato Social / Guerrilheiros /
Ditdadores
|
Orientação Ideológica
|
Direita /
Consumista
|
Esquerda / Comunista / Comunismo e
consumismo distorcido
|
Justiça
|
Poder
Judiciário / Cidadão inocente até que seja provado o contrário
|
Traficantes de drogas / Polícia durante
invasões / Crimes naturalizados pelo local de nascimento
|
Polícia
|
Presença
permanente nas ruas; segurança / Responsável pela segurança dos cidadãos
Ativos
|
Presença intermitente nas favelas;
insegurança / Responsável pela insegurança dos favelados / Inimiga /
opressora
|
Residências
|
Asfalto /
Atendida por serviços básicos como luz, gás, água, esgoto e telefone / Ruas e
estradas pavimentadas / Casa a ser
protegida pelo Estado
|
Morro / Favela; sem infra-estrutura;
distante da presença do Estado /
Ruas não pavimentadas; difícil acesso / Possível foco de doenças / Locus do Mal
|
Religião
|
Homens de Deus
/ Graça divina
|
Ateus / Homens do mundo / Desprovisdos por Deus / Atendidos pelo
assistencialismo - clientelismo
|
Neste quadro que montamos para análise do mito, temos
a contraposição de relações entre indivíduos e o Estado, que trabalhamos com
profundidade em nossa monografia. No entanto, esse quadro nos serve também aqui
como guia de raciocínio para entendermos as diferenças e oposições de
tratamento aos cidadãos e os marginais. Serve para entendermos, quando
abordarmos mais adiante a Ideologia do
Medo, como o Estado é utilizado como instrumento de poucos segmentos
sociais.
A ILUSÃO GERADA PELO MEDO
Nos preocupamos em traçar a história do “Complexo de
Manguinhos” desde quando foi pensada como uma
zona digna de figurar entre as melhores urbanizadas (REIS, J. O.,
1943: p. 94), até os dias de hoje, quando
é apontada como uma das mais miseráveis áreas do Rio de Janeiro. Estudamos com base no mito
construído para a população, analogias entre a “ameaça vermelha” de ontem e a
“ameaça vermelha de hoje”, entre os estudos realizados por cientistas sociais que
atuam na academia e obras que avaliamos servir à perspectiva da Industria Cultural[5], onde se constrói o mito do
Comando Vermelho. Abordamos também o
fato da casa Amarela, em pouco tempo,
não servir mais como esconderijo para os bandidos, apoiando-nos nesta breve
citação de Hobsbawm:
O banditismo floresce quase invariavelmente em áreas
remotas e inacessíveis, tais como montanhas, planícies não cortadas por
estradas, áreas pantanosas, florestas ou estuários, com seu labirinto de ribeirões,
e é atraído por rotas comerciais ou rotas de grande importância, nas quais a
locomoção dos viajantes, nesses países pré-industriais, é lenta e difícil.
Freqüentemente basta a construção de estradas modernas, que permitam viagens
fáceis e rápidas, para reduzir bastante o nível de banditismo. (HOBSBAWM, E.,
1975: p. 14)
As intervenções urbanísticas realizadas nas favelas,
desde que acompanhadas por aparelhos sociais que resgatem as pessoas à
cidadania, funcionam como uma política de distribuição de rendas, onde os
bairros de cartões-postais da cidade, deixam de receber os volumosos
investimentos em embelezamento, e estes, passam a ser direcionados ao subúrbio
e as favelas do Rio de Janeiro. Essa fórmula para acabar com os esconderijos,
com os territórios marginais a ação do Estado, são tão simples e óbvias, que
mesmo moradores de comunidades carentes que jamais tiveram contato com o
renomado historiador inglês que citamos, ressaltam sua eficiência:
À medida em que as ruas ficam largas, não têm barracos
pra se esconder... uma pergunta que [se] faz: se as pessoas que... elas
estimulavam a ação do tráfico. Não, é o lugar! Então quando o governo vem e
tira as casas das margens do rio, alarga as ruas, diminui o espaço físico da
Varginha, não tem mais como o tráfico se esconder![6]
Seguiram aos anos 90, duas
intervenções que mudaram a comunidade. Como ressaltamos, Varginha e a sua casa Amarela, além de um exemplo de memória enquadrada[7],
tem em sua história intervenções urbanísticas que denotam redistribuição de
renda. Ao contrário do aumento do Poder repressivo que se seguiu até o período
de abertura do regime, o Governo Brizola, eleito em 1982, implementa uma
política de entrada da polícia nas favelas com finalidades específicas. Uma
política de seguidas desapropriações de fazendas não utilizadas, de abertura de
aparelhos sociais em favelas como a Casa Comunitária e o Centro Comunitário de Defesa
da Cidadania (CCDC), além do programa de Cada
família um lote, que trouxe o respeito e simpatia dos favelados.
Apesar disso, através da
experiência política brasileira, sabemos que o maior problema de um governo, é
o próximo que virá. As descontinuidades nas políticas sociais, econômicas e
culturais, muitas vezes são marcadas por simples alterações em nomenclaturas,
ou até, em uma total mudança em projetos que funcionam, mas que, porém são
marca registradas de outros governos. Os dois governos de Brizola não foram
seguidos de políticas que concentrassem seus investimentos no social. Uma de
nossas entrevistadas explica a relação do Estado
com a favela em gestões diferentes, dizendo que ...a polícia durante o governo Brizola entrou com mais respeito... o
Brizola. Agora, quando entrou o Marcelo Allencar, isso não aconteceu não, isso
mudou[8].
Na segunda intervenção
que Varginha sofreu, o município era governado por César Maia, e mesmo sem os
equipamentos sociais que reintegrariam os favelados a sociedade[9], continuaram a urbanização de
comunidades carentes na Capital do Estado. Superando as questões do poderio dos
votos vindos de áreas carentes do Rio de Janeiro, sua postura de urbanização
das favelas, com o Programa Favela-Bairro, reassentou 22.300 pessoas,
pavimentou 2,28 milhões de m² de ruas[10] e defendeu o direito do favelado de
ficar em seu lugar[11], gerando críticas de alguns setores
sociais.
A partir de um
levantamento minucioso da utilização do vermelho como ameaça patogênica
estrangeira, ameaça à moral, à tradição e à família desde o início do século XX
(MOTTA, R., 2000), concluímos que não podemos estudar mais analogias entre os
movimentos revolucionários do regime de exceção civil-militar e o tráfico de
drogas como conhecemos hoje, porque elas simplesmente não existem além da
“ameaça vermelha”. Se houve realmente algum contato entre os presos políticos e os comuns durante o cárcere no Instituto Penal Cândido Mendes, na
década 70, não existe uma obra definitiva sobre o tema por dois motivos: o
primeiro é que qualquer trabalho sobre essas memórias, tão vivas no cotidiano
fluminense e brasileiro, suscitam as subjetividades pertinentes a cada classe
social contemporânea a elas que ainda hoje sofrem de alguma forma com os
efeitos dos anos de ditadura. São militares, sindicalistas, estudantes,
policiais, políticos, jornalistas, religiosos, professores, e muitas outras
classes que tem suas vidas relacionadas, direta ou indiretamente, pelos efeitos
da propaganda e censura contra a “ameaça vermelha”. São pessoas que ainda
mantém vivas em suas memórias todas as influências que sofreram ao longo dos
anos de ditadura civil-militar. O segundo ponto é uma verdadeira batalha
historiográfica pela construção de novas memórias, visando atingir as gerações
vindouras. A história do vencedor, ou a história de quem pode manter uma
memória hegemônica, é sempre conveniente a quem pretende manter-se no Poder.
Enquanto o mito de origem do Comando
Vermelho dentro da casa Amarela
aponta uma memória coletiva muito mais ligada a uma construção própria de
alguns moradores de Varginha/Manguinhos, sua conformação decorre de uma
construção sobre um mito ainda maior, que de um lado envolve as classes
conservadoras que estiveram e estão a frente do Estado brasileiro, e de outro, muitos militantes que optaram pelo
vermelho como bandeira ideológica e outros mais marginalizados que foram
identificados com eles. A casa Amarela,
o Comando Vermelho, Varginha e
Manguinhos, apresentam portanto, acepções pertinentes ao estudo das políticas
de controle social, presentes também no mito. Etimologicamente, o mito narra
efeitos lendários de seres fantásticos ou sagrados, mas também, pode ser usado
como solução ideal para conflitos que
não podem ou não devem ser solucionadas no plano real.
O mito do Comando Vermelho, em Ilha Grande, em
Manguinhos, nas favelas, ou presente no cotidiano de cada fluminense e
brasileiro, gera histórias sobre histórias guiadas por uma idéia comum de que a
violência, originada num passado ligado ao terror que representava o comunismo
no Brasil do início do século XX. Essas histórias são num todo, um castelo de
cartas onde teorias baseiam-se em recortes jornalísticos que pouco tiveram, em
um passado de submissão ao regime ditatorial e sua posterior submissão a
interesses elitistas, um compromisso com a pesquisa e busca pela realidade.
Podemos então, com esses
poucos intrumentos, abordar a utilização de ambas as “ameaças” em dois períodos
de nossa história, destacando claramente a postura da elite social brasileira e
de seus marginalizados. Mitos desagregadores de uma sociedade ainda pautada num
código de poder que começa na propriedade de terras e mantém-se com a alienação
dos cidadãos e não-cidadãos, alimentados pelo direcionamento da educação, cinema,
televisão, rádio etceteras.
Nos reservamos a apostar
em Varginha como um exemplo de redistribuição de renda. Duas simples
intervenções urbanísticas, onde por poucos anos se deixou de investir no
embelezamento e segurança em regiões como a Barra de Tijuca e da Zona Sul da
capital do Rio de Janeiro. Além disso, em Varginha, a construção do Centro
Comunitário de Defesa da Cidadania levou àqueles favelados marginalizados, o
acesso aos seus direitos, coisa que dificilmente atingiriam apenas com o
conhecimento adquirido nos colégios públicos da Cidade. Segundo Nilo Batista,
em 1991, então vice-governador de Brizola, a intenção de toda ação em Varginha
e principalmente, da construção de um CCDC era instalar órgãos estaduais nas
favelas. A polícia entraria na frente para ocupar os morro e abrir a
possibilidade de instalação de tais aparelhos sociais:
Ele também quer a presença da Defesa Civil e do Corpo
de Bombeiros trabalhando em total integração com a comunidade [Nilo Batista]. O
vice-governador disse também que tem conversado com o desembargador Jorge
Loretti, presidente do Tribunal da Justiça do Estado, pois que também um juiz
de paz nos morros e favelas, para resolver os pequenos conflitos, além de um
defensor público, que atuaria como advogado das comunidades. (O Dia, 02
de outubro de 1991).
Percebemos que mesmo mal
planejada ou sem continuidade, uma simples ação do Estado para uma parcela da sociedade fluminense desfavorecida,
ocasionou em uma grande mudança na vida dos moradores da comunidade. Concluímos
então, depois da apresentação destes argumentos, dispostos em capítulos, que
existe uma pré-disposição deliberada das elites sociais em se velar
determinadas discussões que levariam verdadeiramente a diminuição da violência.
Deixamos em caráter marginal uma abordagem que releve o porquê da violência,
ignorando o porquê da miséria da maior parcela de nossa sociedade.
São as idéias e valores
arraigados em nossa formação social-política-religiosa, bem como a ação de
revisitar nossas memórias, as responsáveis por nossa conduta diante dos
acontecimentos presentes, determinantes de nossa inércia ou movimento diante
dos fatos cotidianos. Desta forma, cremos ser interessante para nosso trabalho,
entender como são moldadas nossos sentimentos, opiniões e expressões diante de
tais acontecimentos que percebemos ou não em nosso dia-a-dia.
Em consonância com o
trabalho de Marilena Chauí (CHAUÌ, M.,1980 e 2000) apontamos que as transformações
de idéias da classe dominante em idéias dominantes para a sociedade como um
todo, fazem com que a classe que domina no plano material (econômico, social e
político), também domine no plano espiritual (das idéias), tem por finalidade a
manutenção de um estilo de vida conveniente para quem está e quer manter-se no
Poder. A filósofa define isto como ideologia,
que funciona como uma “ilusão”, necessária a dominação de uma classe. É
ressaltado, porém, que não devemos entender por ilusão, “ficção”, “fantasia”,
“erro” ou “falsidade”, pois assim, poderíamos chegar a supor que existem
ideologias verdadeiras, boas, e ideologias falsas, más, ruins. O que devemos
entender por ilusão é “abstração” e “inversão”, ou seja, um jogo de lentes,
onde a população forçosamente desliga-se do real,
admitindo que aquilo que se vê nas novelas, filmes,séries ou demais
propagandas, pode vir a fazer parte se suas vidas, dependendo de seu esforço,
crença e esperança, criando assim, uma realidade “abstrata”, “inversa”, enfim,
o ideal.
Contudo, para que uma
ideologia funcione eficazmente, são absolutamente imprescindíveis dois pontos:
ela deve aparecer para toda sociedade como acessível e/ou necessário. Ou seja,
os dominados devem crer que a ideologia não serve a ninguém, não beneficia e
nem parte de nenhuma classe social, e que funciona como uma verdade
incondicional, incontestável a todos. O segundo ponto, é que a população não
deve perceber que está dividida em classes, ou que pelo menos, essa divisão não
faz diferença no tocante as oportunidades de crescimento profissional,
financeiro, político... Exatamente o que a maioria da população pensa sobre os
favelados e traficantes, se perguntando o porque dessas pessoas escolherem o
caminho da vagabundagem, do tráfico de drogas...
Desta forma, embora a
população brasileira veja diariamente em pesquisas e estudos que existem as
classes A., B, C... os meios de comunicação de massa cuidam para que cada
pessoa pense que vive dentro de um sistema que oferece chances iguais de
ascensão social. De fato, mesmo em nossa abordagem que expõem uma divisão
social redutora em marginais e
cidadãos, morro e asfalto[12], o futebol, o carnaval, as praias,
as novelas e demais programas, amplamente disseminados nos meios de comunicação
de massa “unem os brasileiros” de uma Cidade
Partida (VENTURA, Z., 1994) entre o morro e o asfalto, sob a égide de
características comuns (CHAUÍ, M., 2000), como insistem os intelectuais
responsáveis por pensar as idéias e valores de ideologias como a religiosa e de
consumo. A própria diversidade étnica e cultural, tornou-se um fator
diariamente celebrado como característica de união do povo brasileiro. É
através da propaganda das raras exceções de enriquecimento, ilícito ou não, de
pobres que trabalharam incansavelmente, que a expressão Nunca Desista[13], continua através da mídia a
fantasiar a igualdade de condições entre os brasileiros; favelados ou não. Em
nenhum momento discute-se o papel do Direito ou das Leis na manutenção da Ordem Social. Torna-se claro apenas que
é por meio do Estado de Direito ou das Leis, que as Relações Sociais se regulam, fazendo com que as situações de
violência apareçam como legais e legítimas aos olhos dos dominados da sociedade
brasileira (CHAUÍ, M., 1980: pp. 91, 102-104).
O medo como ideologia, antes e agora, ao mesmo tempo assola e
alimenta os discursos das classes dirigentes brasileiras. O medo, partindo da classe dominante,
pensante, mostra-se como as características de qualquer ideologia: um conjunto
de idéias e valores concatenados e coerentes entre si, disseminadas para que,
finalmente, seja formada na sociedade aquilo que Gramsci chamou de Senso Comum[14].
Tal idéia de todos, justamente o que
descrevemos como senso ideal de
igualdade de condições e também pensamento, funciona no fornecimento do pretexto
necessário para o aumento do poderio repressivo do Estado, pois O medo corrói a alma, e sociedades
assombradas produzem políticas histéricas de perseguição e aniquilamento (BATISTA, V. M., 2003: p. 105).
O mito de origem e desenvolvimento do Comando Vermelho, da “ameaça vermelha”
no presente ou no passado, serve aqui como uma resposta imaginária. Como escape
para uma situação conflituosa real
onde as elites conhecem as suas causas, mas não podem resolver o problema sob
pena de perda de seu modus vivendi.
Desta forma, percebemos que deliberadamente, o mundo real é o produto do mundo ideal (MARX, K. e ENGEL,
S., 1987: p. 18), ou
seja, o mundo real (violência =
miséria, discriminação, má distribuição de renda), é mascarado pelo ideal (violência = aumento da repressão). Uma conclusão, que se alcançada, pode
aproximar as classes empobrecidas da percepção do real. Por sua vez, à descoberta da exploração e do uso, ou seja, à
descoberta de que existe um engodo lustrado e exposto à toda população como
“única via”, acarretaria invariavelmente em uma Crise de Hegemonia[15]. Esse seria o fim da
ideologia do medo, o que nos leva a crer que também seria acompanhada de uma
provável mudança na estrutura social brasileira.
À luz do que apontamos sobre as obras romanceadas que
relatam entes fantásticos, ou origens tornadas sagradas na construção da
memória popular, no passado e no presente. E a procura do saber por onde todo o
ideal se projeta, quando falamos
sobre favela, pobreza, marginalidade, Comando
Vermelho e a relação do Estado
para com o indivíduo, pode ser
mensurada em Adorno, que resume:
Essa adaptação se realiza mediante a pontos da
indústria cultural, como o cinema, as revistas, os jornais ilustrados, rádio,
televisão, literatura dos best-seller dos mais variados tipos, dentro do qual
desempenham um papel especial as biografias romanceadas. É por demais evidente
de que os elementos de que se compõe essa ideologia intrinsecamente uniforme
não são novos, freqüentemente ao invés das técnicas usadas para sua difusão; e
muitas vezes encontram-se até imobilizados e petrificados. ADORNO, T.W. e HORKHEIMER, M., 1973: pp.
200-201).
O romantismo proposto na obra de Carlos Amorim
(AMORIM, C. 2004), que imortaliza as origens do Comando Vermelho alienando-a ao convívio e ensinamento de presos políticos aos presos comuns, tem em jornais da década de
1980, uma base interessante de ser ressaltada. A pesquisa do autor, fortemente
baseada nos arquivos do InfoGlobo, produziu o resultado necessário para
continuidade das políticas públicas de repressão pura. O jornal O Estado de São Paulo, foi então
responsável pela publicação do furo jornalístico que “desvelou” o funcionamento
do Comando Vermelho, em 1981. Em sua
matéria, trazia três cartas que afirmavam ser da facção criminosa, embora não
houvesse inscrição alguma nelas. Ao contrário, uma das cartas era assinada como
Grupo Liberdade[16], grupo que logo se
transformou em sinônimo de Falange Vermelha. Contudo, o “furo” jornalístico
seria na verdade fruto de um vazamento de informações da Secretaria de
Segurança do Rio de Janeiro, que funcionava sob o comando de Waldyr Muniz. A
operação de investigação que descobriu as cartas, teve a sua frente, o Coronel
Nilton Cerqueira, respeitadíssimo nos meios militares, por ter liderado a caça
e assassinato de Carlos Lamarca. Como montante da operação, Nilton Cerqueira
conseguira reunir informações que determinaram o futuro da facção. Identificou
uma casa utilizada pelo tráfico como um Aparelho
(assim como podemos fazer se interpretarmos a casa Amarela dentro dessa conceituação) e ressaltou a verbalização
dos integrantes do grupo, como determinantes de que eram grupos de esquerda[17]. Além disso, a reportagem
trazia denúncias de um livro de contabilidade “preto novinho”, que apensar de
não constar o nome da facção, estavam escritos cálculos suficientes para
determinar a ligação da esquerda com o C.V.. O grupo destacado como Os 18 do Comando, foram responsáveis por
conseguir mais 10 companheiros “doutrinados” para sua causa, que contavam com
uma infra-estrutura destinada exclusivamente para a fuga dos ”companheiros”,
como as lanchas voadeiras[18]. Sem antes terminar, e como
se a maioria dos bandidos soubessem ler, apontava ainda o alfabeto congo como
código usado para comunicação entre os integrantes da facção, além de sublinhar
no trabalho, que houve uma apreensão
recente de uma miniatura da bandeira da URSS entre os 18 “vermelhos” (O
Estado de São Paulo. 09 de abril de 1981). E finalmente sentenciava:
Quando a cerca de um mês, surgiu na imprensa o nome
“Comando Vermelho” –batismo de uma sofisticada quadrilha de assaltante de
bancos– muita gente não acreditou na sua existência. Muito menos que ela
pudesse se dispor de incrível organização, que ia do aluguel de lanchas velozes
para propiciar fuga dos presos da Ilha Grande –usando um fundo de reserva fruto
das “expropriações” – como para a compra de armas e munições e até para a
contratação de advogados. E mais: poucos foram os que acreditaram que o
“Comando Vermelho” pudesse ter vinculações com grupos de esquerda (ex-presos
políticos), de quem passaram a adotar métodos utilizados no final da década de
60 e início de 70 para combater o regime. (O Estado de São Paulo. 09 de abril de 1981)
O impacto da reportagem foi tão grande que O Globo se dedicou a escrever sobre a
fuga de cinqüenta presos da mesma facção e sobre a matéria do jornal O Estado de São Paulo, acrescentando
ainda um avião na estrutura de fuga dos bandidos e o novo “furo” de que o novo
chefe da facção, era agora o criminoso “Mimoso” (O Globo. 10 de abril de
1981. Polícia revela quem são os 50
fugitivos que assaltam no Rio). Este “subversivo” ficara conhecido assim, pela forma
educada com que falava com os outros na prisão. Encarcerado dia 22 de abril no
mesmo ano (1981), “mimoso” ficou em uma sala superlotada de cinegrafistas,
repórteres, detetives e outras pessoas ligadas a Secretaria de Segurança
Pública e ao Estado, repetindo copiosamente que A Falange Vermelha é uma invenção da polícia (O Globo. 22 de
abril de 1981. “Mimoso” preso acusa a
polícia de inventar Comando Vermelho) e desmentindo a influência
de presos políticos na década de 1970. Enquanto isso, o Delegado da Polícia
Civil Rogério Mont Karp, tão dedicado a prisão dos bandidos vermelhos quanto o
Coronel Nilton Cerqueira, desmentia o preso, afirmava para as câmeras de TV:
–A Falange Vermelha existe como organização e nasceu
da convivência entre assaltantes e os presos políticos, que lhes passaram o
Know-how, como comandar, como funcionar de forma organizada. Momosos é um dos
líderes da Falange, que tem muito mais gente: já prendemos 15, mas faltam uns
30 –. Garantiu.
Mimoso deu um sorriso e assegurou: –Não sou líder de
coisa nenhuma (O Globo. 22 de abril de 1981. “Mimoso” preso acusa a polícia de inventar Comando Vermelho).
Desde a conformação deste medo coletivo, que é aceita imediatamente no seio da classe média,
uma classe social que apesar de não residir entre as elites-pensantes deste
sistema, mantém-se engajada nestes preceitos por maior facilidade teórica de
acesso ao seu modus vivendi, temos o
conjunto ideológico que invariavelmente no Brasil envolve o Estado e Deus. Daí então, podemos destacar novamente a figura dos
parlamentares que evocam o nome do último para ter alcance ao primeiro, e
expõem-se como únicos capazes de debelar esse imbróglio criado pela própria
classe social que o pressiona. A partir de eleito, a resposta para a violência,
dentro da casa onde emana o Poder oficial, passa a ser, obviamente, repressão.
Embora nos concentremos em questões que envolvem mais a repressão política,
representada pelo controle à expressão diferente dos padrões definidos na Ordem Social, ressaltamos estarem
presentes também, duas outras formas de repressão: a cultural e a econômica,
que pela brevidade de nosso artigo, deixaremos para outra ocasião.
No Estado, a
ideologia do medo ajuda na manutenção
da Ordem, propiciando o aumento do
efetivo policial que auxilia apenas a um segmento social e conseqüentemente
garante que o restante da população dominada, não se rebele contra o sistema. Tornar
o medo, um sentimento não apenas das
elites, mas de toda a população, aparece então na história brasileira como a
grande sacada de manutenção do Poder. O medo,
assim caracterizado como ideologia, revela-se desde o discurso nos pleitos
eleitorais, que podem votar políticos destoantes de esquerda, até a
obrigatoriedade do voto, que força como regra, a principal aliada –e alienada–
da elite, a classe média, a consagrar continuamente seu sistema. A ideologia do
medo funciona, portanto, no sentido
de manter a retórica de equipamento do Poderio repressivo Estatal contra as demais classes
sociais dominadas, que inutilmente continuam crédulas no discurso (Senso Comum)
de igualdade de condições.
Eu tenho medo de perder toda a estabilidade
conquistada. Um dos candidatos eu conheço, o Serra. Ele é o homem dos
genéricos, do combate à Aids. Já o outro, o Lula, eu achava que conhecia, mas
tudo que ele dizia, agora ele mudou. Isso dá medo. Por isso, eu voto 45, voto
no Serra e voto sem medo [19].
Identificamos então o medo dos ricos e dos dependentes do
sistema à incapacidade dos pobres de viver o mesmo estilo de vida. A ideologia
do medo, através do mito, trata de conter a “ameaça vermelha” e favelada, em
uma área geográfica pré-determinada pela pobreza e miséria, reprimindo-a com a
relação estabelecida na Genealogia da
moral (NIETZSCHE, F. W., 2001: p. 26-39), onde a oposição de valores morais
se constrói a partir do contraste entre, por um lado, “bom” = nobre, elevado, distinto, aristocrático, excelente, ilustre
por suas virtudes; e, por outro lado, “mau”
em sentido “ruim” = plebeu, medíocre,
baixo, comum, vulgar. É também, onde o “bem”,
a elite de nossa sociedade, é representada pelo credor, com liberdade de ação
não só por controlar as Relações de Poder[20],
mas também por inculcar o sentimento de culpa, de dívida, do mal, do devedor,
naquele que, baseado numa relação de compradores e vendedores, credores e
devedores, merece ser acossado pelo simples fato de jamais conseguir pagar o
que deve.
A favela como locus do mal, lugar da sujeira e da desordem (BATISTA, V. M., 2003: p. 105),
protegida por políticos como Brizola, bem armada com os marginais, perigosamente enriquecida com o tráfico de drogas e que,
potencialmente, pode fazer-se representar em qualquer pessoa, como vimos na
tiragem feita pelos policiais, fomenta ainda mais o medo das elites dominantes: uma ameaça a Ordem Social. Clamar por mais repressão, torna-se por meio da
ideologia, uma necessidade real dos
dominantes e uma ação de segurança ilusória ideal
para os dominados.
Às vésperas da nova eleição, a população do lado da
legalidade exige dos políticos definição para o problema atual do Rio. Nas ruas
da outra cidade, a que está no mapa, a população ordeira desapareceu das ruas
(...) submetida ao medo. Os cidadãos que moram na cidade que está no mapa já
não suportam submeter-se à outra população, armada, em contínua expansão,
acasalada sob o guarda-chuva protecionista dos traficantes, dos bicheiros e dos
políticos populistas (BATISTA, V. M., 2003: p. 104).
A historiadora Vera
Malaguti Batista, em sua tese de doutoramento, O medo na cidade do Rio de janeiro: dois tempos de uma história,
resume também o medo como método de
manutenção da Ordem Social:
O medo torna-se fator de tomadas estratégicas no campo
econômico, político, social e cultural. O medo corrói a alma, e sociedades
assombradas produzem políticas histéricas de perseguição e aniquilamento. O
medo também paralisa: nos medos de ontem, como nos de hoje, não se questiona a
violência de uma sociedade tão desigual e tão rigidamente hierarquizada, mas
proclama-se por mais pena, mais dureza e menos garantias no combate do que
ameaça, criando uma espiral aparentemente infinita que vai afastando cada vez
mais o debate das questões nodais da história do Brasil: igualdade, liberdade
acesso à terra, direitos, enfim, o protagonizo econômico, social e cultural do
povo brasileiro. (Jornal do Brasil, 5 de fevereiro de 1994. Apud.BATISTA, V.
M., 2003: p. 224).
Em síntese, a Ideologia tão somente, ou em específico,
a ideologia do medo, tendo o Comando Vermelho como mito, é a cortina
que esconde o apartheid social
brasileiro, é, como aponta Adorno: justificação
(ADORNO, T.W. e HORKHEIMER, M., 1973:
p. 191). Enfim, aliena-se a população à ideologia e justifica-se a
repressão com o medo.
Como dissemos,
reconhecemos as intervenções urbanísticas como ação de redistribuição de renda,
onde cumprimento das leis resultou em uma sensível mudança na desigualdade
social, gerando a impossibilidade dos traficantes se esconderem na casa Amarela. Justamente alguma
mobilidade social, como efeito, temida pelos setores sociais mais
conservadores; pois se desenvolveria no nível de um conflito de classes, o que
poderia resultar numa mudança em seu estilo de vida.
BEM-VINDO AO DESERTO DO REAL (ZIZEK, S., 2003)
A conformação da memória coletiva dos moradores de
Manguinhos, atende, a partir do que estudamos, a uma abordagem micro-histórica
do que percebemos em toda sociedade fluminense e brasileira. A ausência do Estado e a permanência do espectro do Comando Vermelho na comunidade de
Varginha e no ideal fluminense nos
fizeram compreender a utilização de tal mito.
Através do exemplo das lentes que transformam o real em ideal, descrito em Ideologia
Alemã[21], o mito de origem e
desenvolvimento da facção criminosa mais conhecida do Brasil, pode ser
interpretado como um fenômeno social encomendado. Não quanto a sua existência,
evidente nas drogas, armas e violência gerada porquanto a isso, mas por sua
representatividade, onde o efeito de sua existência e ações, alimentam a
eficiência do sistema que se inicia com o fato social e termina com a “única
resposta possível”: repressão policial.
O real, como
apontamos, está neste momento no centro de uma disputa historiográfica pela
construção de um ideal que sirva a
determinadas classes dominantes. Existem obras que edificam a idéia da ligação
do Vermelho Marginal com o Vermelho Comunista num passado próximo,
que teria dado origem ao Comando Vermelho.
Outras obras, mais acadêmicas, aprofundam suas pesquisas e teorias na intenção
de problematizar as contínuas discussões sobre esse objeto. A relação entre esses
dois tipos de obras, é que a primeira torna-se amplamente divulgada às massas,
através das mini-séries, novelas, livros romanceados, etceteras, caracterizando-se
dentro do conceito de Indústria Cultural.
A segunda, restringe-se, normalmente, ao meio acadêmico, onde um número ínfimo
de iniciados –com relação ao total da população– não consegue massificar o
produto de seus estudos devido a longa distância entre as suas produções e a
capacidade, comprometida pelo fraco ensino despendido a absoluta maioria da
população, de leitura e interpretação.
Acadêmicos das ciências sociais, de uma forma geral,
não compreendem aqueles trabalhadores intelectuais que cita Marilena Chauí, responsáveis
pela criação e manipulação do conjunto de lentes convergentes usadas para a idealização do real, pois trabalham pelo Estado
e não para ele. Os responsáveis por pensar essas idéias e valores –tais lentes–
que distorcem o real, transformando-o
no ideal, são os intelectuais das
classes dominantes, que também podem ser acadêmicos, mas sobretudo,
jornalistas, escritores, cineastas, teatrólogos, etceteras, que tem sua
produção vinculada às necessidades e demandas das elites sociais. Ou seja, suas
produções intelectuais, são financiadas, ou se fazem financiadas pelo contato
direto com tais classes sociais, atendendo a especificações que findam
sentimentos, sensações, efeitos, conseqüências e consciências que criam ou
mantém o jogo de lentes.
Identificamos então, em síntese, o mito do Comando Vermelho, a qual nos referimos
em todo trabalho: As elites sociais dominam o Estado, se utilizando dele para manutenção de seu estilo de vida,
através da disseminação de idéias e valores que fazem com que as demais classes
percebam os fenômenos sociais da maneira apropriada a elas. O estímulo ao medo desvia as atenções para o fenômeno
social encomendado (Comando Vermelho),
transformando a violência em uma quimera que deve ser combatida da “única forma
conhecida” (jogo de lentes – idéias e valores). Neste caso, como já dissemos,
esse processo se aprimora gerando avidez por mais controle social e armamento
do Estado, representado na favela
pela polícia, como afirmou o Capitão Pimetel, do Batalhão de Operações
Policiais Especiais (BOPE): O único
segmento do Poder do Estado que vai ao morro é a polícia, e só a polícia não
resolve (Notícias de uma
guerra particular. João SALES, M. e LUND, K, 1999).
O mito de origem e
desenvolvimento do Comando Vermelho,
nos mostra então uma solução imaginária, trabalhada deliberadamente através da
ideologia do medo, para criar um ideal capaz de nos fazer enxergar que
“monstros desumanos” matam pelo ódio a vontade
geral, ódio ao bem e a
democracia, à cidadania ativa, pelo culto ao que é mal, pelo imoral, pela preguiça, vagabundagem, pela falta de
higiene, pelo afastamento de Deus e uma série de outros motivos alheios à
miséria material e espiritual. Diariamente dezenas que
notícias são veiculadas em jornais televisivos e impressos, entre outros periódicos,
onde o bizarro, o medo, o terror, o macabro, o terrorismo, a barbárie, o
inominável, tomam o foco das reportagens. O caso mais chocante envolvendo
traficantes de drogas em 2005, fechou o ano com um incêndio a um ônibus no dia
29 de novembro. Cinco pessoas morreram carbonizadas, dentre elas, um bebê de 1
ano e 1 mês (Jornal Extra. 05 de janeiro de 2006. Terror no 350). Apareceram novamente os monstros, os terroristas,
os desalmados.... a pressão da imprensa por justiça levou a polícia a prender, por
engano a namorada do mostro (O Globo.
09 de dezembro de 2005. Presa a namorada
do monstro) que teria ordenado o incêndio. Quase trinta dias depois foi
descoberto que a menina era, na verdade, ex-namorada
do monstro. Esta foi inocentada, partindo a polícia para a eleição de uma
nova namorada para monstro, já que ele estava distante demais da justiça. Mais
uma ex-namorada do monstro foi presa
e inocentada... Como sempre acontece nesses casos extremos, a Pena de Morte foi
novamente levantada como bandeira. Naturalmente, assim como não podemos negar a
existência da violência e do Comando
Vermelho, não há razões suficientes para desculpar os assassinatos
ocorridos nesta tragédia. No entanto o drama vivido pelas famílias cariocas
pode ser também analisado pela exploração realizada sobre o acontecimento.
Se você tivesse nascido no morro, você seria o que?
Essa pergunta diretamente
feita ao chefe de polícia civil, em 1997/1998, Hélio Luz, foi realizada durante
documentário Notícias de uma guerra
particular.
Qual é opção que tenho? Se conseguir um emprego, eu
vou ter que trabalhar 12. 8 horas por dia para ganhar R$ 112,00. De repente se
eu me encaixo no tráfico, eu ganho R$ 300,00 por semana. Não é negócio? É
negócio para qualquer um! Só não é negócio para quem nunca teve... que ficou
desempregado. Para quem nunca passou fome. Para um miserável é negócio. E aí
não é questão de não ter jeito, o pessoal vai fazer fila para trabalhar. Não é
um emprego? É um emprego! Não é opção não, é emprego! Ganha mais que o pai. (O Globo. 09 de dezembro de 2005. Presa a namorada do monstro)
Essa postura que suscita
defesa àqueles que vivem no locus do mal,
a mínima defesa que um humano pode nascer livre, inclusive de idéias e valores
quais forem, de que podem ser de alguma forma empurrados ao tráfico, a
marginalidade, é interpretado como um ataque ao sistema, prontamente defendido
por aqueles causam a violência, aqueles que vivem dela, aqueles que são
alienados a ela e aqueles que são viciados nela, deixando a mudança a cargo da esperança,
não se vendo mais como agentes ativos e construtores da história. A partir do
que descrevemos, acreditamos que esses são os “nossos monstros”, alimentados e
criados pela nossa sociedade, para serem exatamente quem são.
As ocorrências de tráfico
de drogas ou tráfico/porte de drogas, registradas pela Polícia Civil do Rio de
Janeiro (Capital), apresentaram uma média de 8.941 casos entre os anos de
1996-2001[22]. Foram
7.064 em 1996, com um grande salto em 1997, passando para 10.852, porém
mantendo-se estável nos outros anos até 2001. Esses dados, da Secretaria de
Estado de Segurança Pública, apontam também que as ocorrências de homicídios
dolosos mantiveram-se com uma média na casa dos 2.000 casos no mesmo período.
Porém, os roubos alcançaram um aumento “assustador” de quase 175%. Registrado
29.756 roubos em 1996, os números seguiram subindo aos milhares: 35.963 em
1997, 39.589 em 1998, 46.709 em 1999, 50.815 em 2000 e 52.888 em 2001. As
políticas de Segurança Pública implementadas neste período não realizaram as
promessas que já são feitas a décadas, de controle da violência no Município,
porém, a repressão aos movimentos sociais, leia-se greves, passeatas e
protestos, foram e continuam sendo eficientes. Neste mesmo período, uma
pesquisa do Instituto Pereira Passos revela que surgiram no Rio de janeiro 100
novas favelas, pelo menos uma em Manguinhos, chegando ao número total de 513,
em 2000 (www.favelatemmemoria.com.br:
2005). E neste exato momento em que escrevemos, surge mais uma em Manguinhos,
ocupante do prédio abandonado da Embratel, na Leopoldo Bulhões.
Entender o por quê de
homem ir morar num local de alto risco, ou num lugar que lhe obriga a subir
ladeiras intermináveis, no meio de uma guerra entre policiais invasores e
marginais fortemente armados, e ainda levar sua família com ele, talvez possa
ser entendido através de alguns dados de injustiça social, fornecidos pela ONU.
No último relatório (2005) realizado pelo Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento, de 177 países que a compõe, ou que foram estudados, o Brasil
ocupa a posição 169 do ranking. Ou seja, a desigualdade social no país, é maior
do que em países como Trinidad e Tobago, Tonga e Malásia, estando melhor apenas
do que alguns outros países que enfrentam ou enfrentaram sangrentas guerras
civis, como Serra Leoa, Botsuana, Lesoto, e República Centro-Africana. O
coeficiente usado pela ONU para medir a distribuição de renda é o Gini, que oscila entre zero e cem, onde
zero significaria renda igualitária e cem, uma concentração absoluta nas mãos
de um indivíduo, ou família. O Gini
brasileiro é de 59,6 pontos. A interpretação desse dado pela própria ONU, deixa
claro que 46,9% da renda de todo país, concentra-se nos bolsos de apenas 10% da
população, da qual tratamos durante todo trabalho como elites sociais. De outro
lado, o mesmo indicador aponta que outros 10%, desta vez os mais pobres,
resguardam apenas 0,7% de toda a renda nacional (www.pnud.org.br/rdh/: 2005). Consideraremos
também, um outro dado do IBGE, que aponta um percentual elucidativo: 70% de
todos os domicílios dos principais municípios do país, ficam em aglomerados
subnormais, ou seja, favelas (www.ibge.gov.br/:
2005).
Um estudo da ONU, projetando algumas simulações sobre
a realidade econômica atual, mostra que se houvesse efetivamente uma política
modesta, quase insignificante de distribuição de renda, a situação do País
melhoraria de forma dramática. Uma transferência de apenas 5% da renda dos 10%
mais ricos para os mais pobres seria capaz de retirar 26 milhões de pessoas da
linha da pobreza e reduzir a taxa de miséria de 22% para 7% da população. É
exatamente o que cansei de perguntar aos políticos. Seria um absurdo realizar
algo parecido no espaço de uma geração? (Jornal Montbläat. 09 de setembro de
2005.Um país injusto chamado Brasil )
Embora prevaleça o Senso Comum de que o Trafico de Drogas
não pode substituir o Estado, pois
não dá segurança, saúde e educação... devemos ressaltar que em algumas obras
que citamos aqui, sobre teoria do funcionamento de um Estado Moderno, como em Rousseau, Locke e Hobbes, essas obrigações
não aparecem. Em Montesquieu, a educação mereceu um capítulo inteiro,
destacando apenas os valores a serem propagados para a manutenção de cada tipo
de Estado: No despotismo, a educação é servil, voltada a aviltar os cidadãos;
No Monarquismo, o ensino volta-se para a honra, onde o súdito dedica-se a
servir o rei e No Republicanismo, o ensino se vê mais necessários do que nos
outros modelos de governo, pois há medo de transformação em monarquismo ou
despotismo (MONTESQUEIU., 2000: pp. 71-80). No Brasil, seguindo tais teorias, o ensino torna-se
gratuito aos cidadãos com a Constituição de 1824, no entanto, além da estrutura
social que compreendia a realeza e a escravidão, o princípio da liberdade
(econômica) foi invocado para negar ao Estado
a responsabilidade pela instrução, confiando-a às províncias. Em abril de 1879,
a educação torna-se obrigatória, porém apenas para crianças com menos de
catorze anos e que residissem a um quilômetro e meio de raio da escola. Apenas
com a República, o ensino torna-se obrigatório, gratuito e, principalmente,
laico, para todos os cidadãos (VALLE, L., 1997: pp. 25-85). Em nenhum momento
de nossa história, critérios de qualidade do ensino foram definidos e
discriminados.
Percebemos então que não
são esses pontos de relação do Estado
para com o Indivíduo, que
caracterizam o Estado Moderno, mas
sim, como já citamos, a igualdade perante a ele dos cidadãos e assinatura de um
Pacto Social que reserve aos seus
contratantes, pelo menos, a proteção da pessoa e de seus bens com toda a força
comum a todos (ROUSSEAU, J.-J., 2000: pp. 69-70). Contudo, deixaremos o
desenvolvimento desta idéias polêmicas para um próximo estudo, nos fixando
aqui, descasos quanto a obrigações do Estado
previstas em Lei, como no caso de educação.
Não podemos brindar
século XX como um ano de educação, assim como não podemos brindar nenhum outro
dos séculos de nossa história, se nos referirmos a saúde e segurança para
todos. Os altíssimos índices de analfabetismo do Brasil no início do século
passado, foram substituídos, através de uma educação pouco criteriosa, por uma
alfabetização que findava apenas a assinatura dos próprios nomes dos alunos e a
leitura de grandes manchetes de jornais. Como resultado, chegamos ao século XXI
formando neste país, a cada ano, uma legião de jovens que não tem a capacidade
crítica de pensar as influências que sofrem em seu cotidiano. O ensino público
em tempo integral, proposto por Brizola, combatido pela sociedade carioca[23], juntamente com a diminuição e
desvio histórico de verbas, relegaram aos favelados, que quase exclusivamente,
são alunos de colégios públicos, ao analfabetismo funcional.
Em 2005, a ONG Ação
Educativa e o Instituto Paulo Monteiro, este último, ligado ao IBOPE,
produziram mais uma pesquisa que avalia o Indicador Nacional de Analfabetismo
funcional. A divulgação da pesquisa demonstrou que 38% da população brasileira
pode ser considerada analfabeta funcional, ou seja, não consegue identificar
fontes, localizar e relacionar mais de uma informação, não conseguem realizar a
leitura de longos textos, e muito menos, fiar comparações entre eles. Apenas
25% tem plenas habilidades de leitura e escrita. 77% da população não dominam
as habilidades matemáticas requisitadas em tarefas do cotidiano
(www.acaoeducativa.org.br ). Ou seja,
uma parcela expressiva da sociedade brasileira sequer consegue ler um pequeno
texto e compreendê-lo totalmente, não consegue realizar ou entender cálculos
estatísticos como os que apresentamos aqui. Como esperar que essas pessoas
consigam deixar de viver sem se utilizar das “lentes convergentes”, das
ideologias dominantes, para ver os fatos sociais, o seu cotidiano? Apenas 20%
da população total, tem completo o ciclo básico de ensino (antigos primeiro e
segundo graus)[24].
Como apontamos, todo o Complexo de Manguinhos não conta com
escolas de ensino médio, restringindo-se ao básico e toda formação crítica que
possa ser adquirida com ela. Como resultado, a única cooperativa da região,
trabalha com serviços terceirizados, quase que exclusivamente de limpeza na
Fiocruz. Consideremos por conta disso que um setor social recebe menos educação[25] do que outro, temos então uma
população ainda mais marginalizada. 81% daqueles considerados analfabetos,
estão entre as classes mais pobres (www.acaoeducativa.org.br: 2005). A
diferença entre a favela e o asfalto torna-se ainda mais clara quando
vislumbramos os salários dos chefes de família de cada lado da cidade, para nos
referirmos novamente ao livro Cidade
Partida, de Zuenir Ventura. A renda média de um chefe de família favelado
é de R$ 352,41, enquanto a renda dos chefes de família do asfalto, chega
a R$ 1.533,74 (www.ibge.org.br – censo
2000).
Moradora:
A minha filha passa mal, assim, na madrugada...
entendeu? Eu vou na farmácia... às vezes, eu levo um dinheiro, às vezes é o triplo
daquilo que eu tenho... aí eu chego lá no movimento... “Minha filha ta
doente...” “Cadê a receita, me dá?” Daqui a meia hora o remédio chega (Notícias de uma guerra particular. Op.
Cit).”
Traficante:
Agente supri as necessidades que ela precisa né? É a
necessidade que, às vezes, ela tem de comprar um gás, de comprar, às vezes, um
remédio, de pedir uma ajuda para nós, né? Às vezes, o barraco ta caindo, ela
pede a gente... pede um dinheiro para comprar um material, um biscoito, às
vezes é pra comprar um cigarro mesmo, um papel higiênico, um sabonete... (Notícias de uma guerra particular. Op.
Cit)”
De volta a tragédia do
ônibus 350, o Tenente-Coronel aposentado Milton Corrêa da Costa, já foi
assessor parlamentar da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de
Janeiro. No discurso do militar sobre o incêndio, vemos finalmente o que também
argumentamos sobre pensar a miserabilidade dos favelados e a opção deles pelo
tráfico. Percebemos a relação de funcionamento da estrutura social como “peão”
e as influências das idéias e valores (lentes convergentes), no seio da
população. É claro, a saída, para o fim da violência, continua a mesma:
São assustadoras as
implicações da presença de uma adolescente nesse ato de barbárie, que pode ser
visto como um paroxismo no processo gradual e contínuo de deterioração da
segurança pública no Rio de Janeiro. (...) São ações de ousadia e de descrédito
do poder instituído, objetivando a perpetuação do narcotráfico. Por certo os
cientistas sociais justificarão o atentado contra os passageiros do ônibus da
linha 350 com a exclusão social. Dirão, em seu linguajar rebuscado, que a culpa
é dos "fatores sociais de compulsão à marginalidade (O Globo.. 12 de dezembro de 2005. Tema em discussão: Segurança Pública).
Assim
como nos primeiros meses de 2006, no ano de 1994, uma série de ações
cinematográficas do exército brasileiro nas ruas do Rio de Janeiro, chegaram a
dividir opiniões sobre a eficiência da repressão pura e simplesmente, ou não. O
jornal O Globo publicou várias reportagens sobre as ações dos militares nas
favelas. Exaltando sempre os efeitos positivos das ocupações, alguns dos
títulos diziam: Blindados cercam morros
da Zona Sul, Fuzileiros ocupam morros
e prendem 75, Moradores aprovam ação
dos militares nas favelas... O tom das reportagens beirou ao ridículo
quando se propôs a expor a opinião de alguns favelados:
Choveu na horta do exército.
Mesmo economizando elogios, os moradores das cinco favelas ocupadas pelas
tropas militares de elite abriram suas bolsas animadamente, punham as mãos para
o alto se antecipando muitas vezes ao sinal de revista, riam, cochichavam e
cumprimentavam os soldados. A maioria exibindo pouca disposição para
controvérsia, aprovou a operação. Ao menor sinal de muxoxo ou de temores
evocados pela simples lembrança de 64, os moradores do Dona Marta, Turano,
Chapéu Mangueira, Cantagalo e Andaraí, rebatiam bem humorados: -Pena que não
aconteceu a mais tempo –Vibrou M. (...)Mesmo aqueles acossados pelos militares,
se resvalaram no mal humor, foi por pouco tempo. Desempregado, Marcelo, de 20
anos, não se intimidou diante do soldado que o empurrava com a ponta do fuzil
(...) Ex-soldado do exército, que optou pela vida civil, ele não poderia
renegar os antigos companheiros de caserna (O
Globo. 19 de novembro de 1994. Moradores
aprovam ação de militares nas favelas).
A
matéria continuou, dando ainda mais ênfase:
A operação do exército
também interrompeu funcionamento do tráfico nos Morros de Dona Marta –único
lugar em que os soldados subiram a favela– Turano, Varginha, Chapéu Mangueira,
e no Cantagalo (O Globo. 19 de novembro
de 1994. Moradores aprovam ação de
militares nas favelas).
Talvez
os favelados estivessem mesmo que pensando que tudo dali em diante mudaria em
suas vidas, crendo que a ocupação do exército àqueles territórios alienígenas
ao Estado fossem finalmente
incorporados a ele, não só no pagamento de impostos, mas também, pelo menos, na
segurança. Contudo, a operação do Exército mostrou-se um verdadeiro plus de todas operações já realizadas
pelas forças policiais fluminenses.
Com seus canhões voltados para a entrada dos Morros do
Cantagalo, Pavão-Pavãozinho, três blindados reforçaram ontem a operação do
Exército nas favelas da Zona Sul. (...) na terceira intervenção do Exército nos
Morros de Copacabana e Ipanema, os soldados passaram a cadastrar os moradores,
provocando enormes filas... (...) Oficiais que participam da ocupação do
Complexo do Morro do São Carlos afirmaram ontem que estão usando mandatos
genéricos, de busca e apreensão, para poder revistar todas as casas suspeitas.
(...) O mandato vem com o nome de uma rua e pode ser usado em outras
adjacências (O Globo. 13 de dezembro de 1994. Blindados cercam morros da Zona Sul).
Nem os mandatos
genéricos, naturalmente considerados ilegais porque davam aos soldados a carta
branca para a invasão de qualquer casa, nem as ocupações das favelas duraram
mais de um dia, voltando todo o tráfico de drogas ao “normal”, ao final de cada
ação militar. Durante as ocupações, o tráfico de drogas cessou nas comunidades,
porém, nenhum hospital de campanha ou outro aparelho social permaneceu nos
locais onde o Comando Vermelho e
outras facções voltaram a dominar rapidamente.
O mito do Comando Vermelho em Manguinhos e no Rio de Janeiro, abordado através do método de
estrutura, além da observância das classes sociais envolvidas, nos afasta da
interpretação meta-física, criando uma interrogação confiável do porquê tais
seres humanos são capazes de tamanha violência contra outros seres humanos. Nos
afasta da discussão de porquê Manguinhos, idealizado em uma zona digna de figurar entre as melhores urbanizadas (REIS, J.
O., 1Op. Cit.), nos afasta do porquê Varginha, idealizada como comunidade
modelo das políticas sociais do governo Brizola, mas que efetivamente continuou
sendo uma das regiões mais marginalizadas do Rio de Janeiro. Do porquê que os
cidadãos preferem a liberdade natural
à liberdade condicionada do Estado, onde teoricamente teriam mais
vantagens[26]. Do porquê a polícia reprime tão
eficazmente os protestos realizados nas capitais nacionais, mas é incapaz de
fornecer segurança a todos. Do porquê a Lei é uma coisa simples para alguns,
aparentando defensora, e para outros, soa como tão ameaçadora...
Pensar no Comando
Vermelho como causa, afasta-nos de soluções como redistribuição de renda e
diminuição da miserabilidade da população brasileira, aproximando-nos da
solução ilusoriamente democrática de pura repressão, que atinge mais as
liberdades e direitos de toda a população que depende da Segurança Pública.
Essa consciência, essa percepção do real, que acontece não mais através das
lentes e ordens vindas de cima, afastou o ex-delegado Hélio Luz, após dar essa
entrevista:
Eu digo, não é preciso ninguém dizer. A polícia é
corrupta, é uma instituição que foi criada para ser violenta e corrupta, não é?
E o pessoal estranha. É porque foi criada para ser corrupta? A polícia foi
feita para fazer segurança de Estado, né? Segurança da elite! Eu faço política
de repressão, entende? Em benefício do Estado, para proteção do Estado,
tranqüilamente. Mantém a favela sob controle. Como é que você mantém dois
milhões de habitantes sob controle, ganhando R$ 112,00? Quando ganha. Como é
que você mantém os excluídos... esses excluídos... calmos? Claro, com
repressão, como é que você vai manter? (Notícias
de uma guerra particular. Op. Cit)
A questão da violência é tratada, portanto, como uma
questão conjuntural e não estrutural. As políticas públicas não assumem as
desigualdades visivelmente presentes na estrutura que montamos, tratando assim,
o mito do Comando Vermelho como um
problema a ser resolvido com soluções ideais.
Por mais que seja óbvio para uma parcela mínima da sociedade de que o contínuo
aumento do efetivo policial, seguido do aumento de seu poder de fogo, não
conseguem debelar o problema da violência, também é óbvio que são essas pessoas
que não conseguem ou que não devem ganhar os grandes meios de comunicação em
massa.
É necessário desvelar esse mito, levando seus estudos
científicos a toda a população, que deve estar preparada por uma educação crítica.
Assim, as ideologias poderão ser quebradas e a raiz do problema poderá ser
finalmente vista e atingida. Em Varginha, resta ainda a memória:
Assim como tem o poder
oficial que tomba historicamente seus patrimônios, ela ficou meio que tombada,
continua lá, de pé, ninguém ocupa, nada acontece, e... nisso ela ficou meio
como um simbolismo, existe uma áurea de mistério em torno dela. É um mistério
que agente tem um certo receio de ‘tar futucando’ para descobrir as coisas[27].
Ao terminar esse artigo, gostaria de trazer uma reportagem
interessante ainda sobre a tragédia do ônibus 350. Novamente ressaltamos que os
assassinatos são inomináveis, mas que usamos o acontecimento com a conveniência
de sua serventia aos nossos propósitos. Por um momento, nos meios de
comunicação de massa (meios naturais de disseminação de ideologias), a idéia de
que as “ameaças vermelhas” estavam presentes, pôde ser percebida em meio a esse
drama. No mesmo ano de 2005, o governo de Luís Inácio Lula da Silva foi
envolvido em um escândalo de corrupção junto ao Congresso Nacional. Sua gestão,
identificada pelas elites sociais como de esquerda, perdeu credibilidade com
tais denúncias que apontavam o pagamento periódico de propinas aos deputados de
vários partidos em troca de apoio no Poder Legislativo, em Brasília. Como nunca
se viu neste país, as Comissões Parlamentares de Inquérito, tornaram-se
programas prediletos de população acostumada apenas com românticas novelas. O CPI do Mensalão, como foi apelidada a
Comissão responsável por apurar as denúncias realizadas por um dos deputados
envolvidos no esquema e desde então, não deixou de ser aproveitado, como título
de uma das matérias, dois dias após a morte das pessoas no incêndio do ônibus
350 no Rio de Janeiro, pelo Jornal Extra: O MENSALÃO PRODUZ BARBÁRIES DESTE TIPO (Jornal Extra. 01 de
dezembro de 2005. O mensalão produz barbáries deste tipo).
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Revista Nação Brasil Número: 143. Entrevista com André Saldanha Costa, é
mestrando em Ciência Política pela UFF. Thiago Braga Vieira é bacharelando em
História pela UFRJ/IFCS. Ambos são membros do Núcleo de Estudos Sobre
Substâncias Psicoativas e Sociedade (NEPAS)
www.vivafavela.com.br
- 10 de fevereiro de 2004 - Júlio Ludemir.
Filmes
1,99, O IMPÉRIO DA NEBULOSA. Marcelo Masagão, 2003.
BRAZIL: BEYOND CITIZEN KANE. Simon Hartog, 1996.
CINCO VEZES FAVELA. Joaquim Pedro de Andrade,
Leon Hirzman, Miguel Borges, Carlos Diegues e Marcos Farias, 1962.
NOTÍCIAS DE UMA GUERRA PARTICULAR. João Moreira Salles, Kátia Lund Brasil, 1999.
O QUE É ISSO COMPANHEIRO. Bruno Barreto,
1997.
QUASE DOIS IRMÃOS. Lúcia Murat. 2005.
[1]
Entrevista concedida por R. Fita 1, Lado B. 31 de agosto de 2004. Projeto
História e Memória das Comunidades de Manguinhos.
[2]
Com base no estudo realizado por Roberto Kant de Lima, em A polícia da Cidade do Rio de janeiro. Seus dilemas e paradoxos.
Ed. Forense: Rio de janeiro, 1995., acreditamos que abordagem das comunidades
unidas, como um “Complexo”, sem o
respeito as suas idiossincrasias é decorrente do mesmo modelo de tipificação de
pessoas realizada pela polícia. Tal tipificação teria então como finalidade a
logística, para melhor conhecimento das favelas da região.
[3] Ressaltamos
que o termo Marginal é utilizado
durante todo o trabalho, como sinônimo daquele que vive à margem do Contrato
Social, ou seja, aquele que por algum motivo não segue as leis do Estado
aceitas no ato de assinatura do Pacto
Social (identificação, no ato de nascimento, como brasileiro). (ROUSSEAU,
J.-J., 2000: pp. 97-98).
[4] “O pacto social estabelece entre os cidadãos
uma tal igualdade, que eles se comprometem todos nas mesmas condições e devem
todos gozar dos mesmos direitos. Igualmente, devido à natureza do pacto, todo
ato de soberania, isto é, todo o ato autêntico da vontade geral, obriga ou
favorece igualmente a todos os cidadãos, de modo que o soberano conhece
unicamente o corpo da nação e não distingue nenhum dos que a compõem.” (ROUSSEAU,
J.-J., 2000: pp. 97-98).
[5] “Essa
adaptação se realiza mediante a pontos da indústria cultural, como o cinema, as
revistas, os jornais ilustrados, rádio, televisão, literatura dos best-seller
dos mais variados tipos, dentro do qual desempenham um papel especial as
biografias romanceadas. É por demais evidente de que os elementos de que se
compõe essa ideologia intrinsecamente uniforme não são novos, freqüentemente ao
invés das técnicas usadas para sua difusão; e muitas vezes encontram-se até
imobilizados e petrificados”. (ADORNO,
T.W. e HORKHEIMER, M., 1973: pp. 200-201).
[6] Entrevista
concedida por G. e C. Fita 02, lado A, 07 de abril de 2004. Projeto História e
Memória das Comunidades de Manguinhos.
[7] “A
memória, essa operação coletiva dos acontecimentos e das interpretações do
passado que se quer salvaguardar, se integra, como vimos, em tentativas mais ou
menos conscientes de definir e de reforçar sentimentos de pertencimento e
fronteiras sociais entre coletividades de tamanhos diferentes: partidos,
sindicatos, igrejas, aldeias, regiões, clãs, famílias, nações etc. A referência
ao passado serve para manter a coesão dos grupos e das instituições que compõem
uma sociedade, para definir seu lugar respectivo, sua complementaridade, mas
também as oposições irredutíveis”. (POLLAK, M.,1989).
[8]
Entrevista concedida por G. Fita 5, lado A. Dia 19 de novembro de 2004. Op.
Cit.
[9] O
Programa Favela –Bairro, possui o POUSO, um posto de Orientação Urbanística e
Social que é instalado apenas no final da realização do Favela-Bairro. Apesar
da intervenção em Varginha e em muitas outras comunidades, o POUSO, que tem a
função de se articular com órgãos responsáveis pelo recolhimento de lixo,
instalação e manutenção da rede elétrica, fornecimento de água e outros
serviços públicos, na foi instalado.
[10]
Dados da Prefeitura do Município do Rio de Janeiro. www.rio.rj.gov.br/
[11]
Tais críticas, normalmente veiculadas em jornais, são feitas à política de
isenção de impostos para moradores de áreas de risco, à remoção apenas em caso
de risco de vida e a política do “deixa ficar”.
[12]
Ou Favela e Asfalto, são expressões dicotômicas utilizadas pela população do
Rio de Janeiro para definir o posicionamento sócio-cultural. Algumas vezes são
usadas de forma discriminadora, tanto por favelados quanto por moradores do
asfalto, por outras vezes, apenas como meio de expressão espacial.
[13]
1,99, O império da nebulosa. Marcelo Masagão, 2003.
[14] Senso Comum é um conceito criado por
Gramsci. Segundo o cientista, o Senso Comum é o ponto de equalização do
pensamento através da influência de ideologias. (CHAUÍ, M., 1980: p. 108).
[15]
Conceito criado por Gramsci, abordado por Chauí para designar ameaça aos
valores e idéias disseminadas pela classe dominante, constituídas como
ideologia. (CHAUÍ, M., 1980: pp. 110-111).
[16]
Também em CV_PCC. Irmandade do Crime,
de Carlos Amorim, o Grupo Liberdade e
descrito como vertente do C.V. responsável pela organização das fugas do
sistema carcerário fluminense.
[17]
Além de “Aparelho”, o jornal destacava a utilização da expressão “Companheiro”,
reutilizando-a sempre que pudesse mostrar algum tipo de relação entre os
assaltantes.
[18]
As lanchas voaderias seriam destinadas a fuga do Instituto Penitenciário
Cândido Mendes, mais conehcido como Presídio de Ilha Grande.
[19]
Atriz Regina Duarte, em campanha pelo PSDB nas eleições para presidente de
2001. http://www.diariodonoroeste.com.br/edicao/2002/10/16/nacional.htm
[20]
Embora Nietzsche não faça a distinção das relações de poder, como já apontamos
na introdução, introduziremos a idéia presente em Foucault, que divide as
Relações Sociais em relações Estado/Indivíduo, utilizando-se do “P” maiúsculo
para o conceito de Poder e Indivíduo/Indivíduo, com “p” minúsculo no tocante
entre as relações entre as pessoas.
[21]
Segundo a interpretação que fizemos desses autores, nos utilizado de preceitos
físicos, podemos dizer que a visão do real
é invertida, sendo colocado de forma ideal
por um conjunto de lentes convergentes. Para uma interpretação social, podemos
ver as coisas da seguinte forma: nossa visão real do fato social é trabalhada por um conjunto de idéias e
valores, que chamamos na câmara escura de conjunto de lentes convergentes, tal
conjunto de idéias e valores, funcionam, portanto, como aquilo que transformará
o real em ideal. (MARX, K. e ENGEL, S. F., 1987) Essas lentes, são, com
efeito, as ideologias, o que em síntese, a filósofa Marilena Chauí chama de
“ilusão”. Para o nosso trabalho, torna-se interessante saber sobre o processo
de criação e manipulação de tais lentes, assim como as finalidades buscadas por
seus usuários.
[22]
Fonte SESP (Secretaria de Estado de Segurança Pública). Gestão de dados,
NECVU/UFRJ.
[23]
Programa Olhar 2005 / TVE. Entrevista com Gisálio Cerqueira, Cientista
Político. 05 de dezembro de 2005.
[24]
Idem.
[25]
Segundo o censo 1991 do IBGE, a população analfabeta com mais de quinze anos
entre os que moram no asfalto é de 6,10%, enquanto a da favela está em 15,36%.
[26] A
relação entre essas duas liberdades está prevista em Rousseau, quando o autor
afirma que a liberdade natural é
conferida a homem desde seu nascimento. Este homem continuará sem leis e regras
até a hora em que decidir –ou for obrigado- pela assinatura do Contrato Social, quando então terá que
abdicar de sua condição natural de liberdade e terá que passar a seguir regras
(as leis), ficando alienado, ou condicionado. Exatamente o que quer dizer Liberdade condicionada. Exemplos desses
conceitos podem ser encontrados durante todo o texto, quando, por exemplo, um
policial deixa a farda e integra um grupo de extermínio. Ou até quando uma pessoa
deixa de comprar Cd’s de músicas originais, quando, teoricamente, gozaria das
leis se por qualquer motivo os Cd’s não funcionassem, e passa a comprar em
locais que não pagam impostos, abdicando assim de sua proteção teórica; das
leis que o defenderiam como consumidor. (ROUSSEAU, J.-J., 2000)
[27]
Entrevista concedida por G.. Op. Cit.
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